Antes só do que…

Ah, como eu odeio a lógica em certos momentos, sobretudo quando ela parece constatar o que sempre pensei nas relações românticas. Aqueles lances de dizer que “quanto mais bonita, maior a chance de ter namorado” ou olhar a dama com o pensamento simples de ser “muita areia pro meu caminhão” ou até mesmo nem tentar uma aproximação com o medo incutido pelo politicamente correto de “invadir a privacidade alheia”.

Parece papo de chorão e, admito, tenho evitado de escrever crônicas que pareçam mais a melação de um solteiro sem perspectivas e niilista com as histórias de amor. No entanto, nestes dias de relacionamentos pasteurizados e redes sociais feitas de álbuns repletos de frases feitas e lances melosos, é difícil acreditar que o amor de verdade vence. Ele vence mesmo?

As máximas que citei no parágrafo acima são coisas que penso comigo desde o tempo de adolescente entrando na faculdade e cujo beijo na boca já era, por si só, um nível inatingível. Há uma paulatina colocação de complicadores na arte do flerte e da aproximação, como se as instruções para conquistar a amada (falo do meu caso, claro) fossem sendo atualizadas e tornando-se tão complexas quanto um livro de leis.

A cada ano que passa, os seres tem se tornado cada vez mais imediatistas e superficiais, colocando sempre mais peso na beleza do que no caráter. Uma chegada calcada na amizade primeira e em belos gestos é tida como careta e frouxa, e tanto se pede de atitude confundindo o termo como uma “pegada” ousada já mesmo nas primeiras frases.

E quem cultiva este sentimento simples e sincero de enaltecer com palavras e gestos vê-se numa sinuca de bico: é cercado pela ditadura da beleza, que exige corpos e rostos quase perfeitos sem nenhum conteúdo interno; ou se vê acuado por mulheres (meu caso, de novo) que deixam a entender que qualquer beleza no trato é sinônimo de “patriarcal” ou machismo. Correr para onde? E existe lugar para correr e investir? É o sentimento clássico de se sentir o gordinho nerd da escola, eterno fracassado na seara feminina.

Como complicamos o amor! Como tudo é complicado para quem olha de vereda e lhe aponta o dedo como um frouxo ao colocar-se como correto e verdadeiro. São tempos estranhos em que, talvez, a multiplicação dos solteiros não se compreenda apenas pela autodeterminação de uma vida livre, mas por este peso proposital das relações: não há quem ceda, não há chance, não há verdade, apenas o artificial que funciona para os cliques e curtidas.

É difícil acreditar no amor de verdade. E quando você se vê como idiota em mais uma tentativa frustrada, o jeito é mesmo começar a pensar naquela velha máxima de nossas avós num passado distante: “antes só do que mal acompanhado”. Ao menos, a vida é sua e já é complicada o suficiente para ser vivida em alguns dias, mas não faltará amigos, cama, filmes e passeios na planilha.

Realmente, a lógica dos relacionamentos é latente e acontece sem muito esforço. Se um dia este escriba estiver namorando de verdade talvez eu rasgue essas linhas mordendo minha lingua. Mas vá por mim, estou certo e o amor, ah o amor, se tornou chato, lógico demais, artificial e falsamente meloso.

Não, e não me recomendem Tinder e afins. Repito minha vó e cravo: “antes só do que mal acompanhado”

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