Qualquer dia de semana na Rua Recife, então estúdios da PG2, na esquina com a Duque de Caxias.
O relógio perto das 17h, quando eu tomava um ar fresco na varanda da emissora/casa por qualquer motivo. E aparecia um Mercedes cupê negro lentamente cruzando a via.
Se o seu condutor me visse por lá, era uma buzina animada, um sorriso e um aceno. Digno de pai, gesto cálido, um “olá” carinhoso, verdadeiro sinal de estima a distância.
Estima, carinho, paternalidade, sensibilidade. As vezes essas coisas rareiam no rádio dada a frieza das relações e vaidades que criam rixas e inimizades.
Não para aquele senhor, mesmo na clausura silenciosa de um bólido alemão de luxo de linhas, mas não de luxuria de atos, muito longe disso.
Na lida das ondas hertzianas, sempre procuramos em tempos de “peixe pequeno” alguém que nos ensine a pular sobre eles e mostrar quem somos sem o peso da mesma vaidade, sobretudo dos homens e mulheres que dirigem emissoras espalhadas pelo espectro do FM.
Brincava rindo, em vários encontros nossos, o chamando comicamente de “pai”. Era genuíno, se sentir acolhido por um amigo da mesma profissão e que te vê como um aluno ávido por querer aprender e ir mais além no que gosta.
E encontros foram vários: eventos, visitas ocasionais à sua casa na Quênia, ligações, orações pedindo pela plena saúde de um combalido corpo físico e um riso aqui ou acolá vindo de um coração de verdade: o da alma, o do sorriso.


Mas, no rádio, desligar um microfone definitivamente é o momento mais pesado para quem milita por ele.
E quando quem está atrás do microfone não falará mais? Como substituir o silêncio?
E a figura singular? Como você explicará aos jovens que pousam no rádio que existiu alguém com coração de verdade afagando aos esforçados e admiradores daquele velho lobo bom do comunicar?
Me recuso a desligar este microfone. Eu e todos que o viram e conviveram com a doçura dele vamos falar e lembrar de todos dos encontros e momentos inesquecíveis, cheios de leveza e lições.
A casa da Rua Quênia tem uma cadeira vazia.
A Rua Recife não verá o Mercedes cupê cruzando ela pelas 17h de um fim de dia qualquer.
Os alunos de outros tempos não verão mais o professor aplicado.
O microfone, pelo fim do expediente, será desligado.
Os sonhos de compartilhar trabalho e manhãs jornalísticas ficaram em algum lugar.
A cuca de uma manhã de risadas, nunca vou poder pagar mais.
Só que, ondas são eternas como pessoas que se vão com elas. Como a gratidão e a saudade que nos abrem um sorriso em meio as teimosas lágrimas.
E convidando a quem quiser, abro o microfone de novo e digo solene e calmo: gratidão, Tibério!
Aquela cuca fica pra algum dia, e eu pago.
E um dia a gente se senta junto pra fazer o jornal da manhã.
Afinal, desligamos microfones, mas amigos saudosos sempre serão ouvidos em algum lugar da nossa oração.
Gratidão, Tibério.
Gratidão, “pai!”