Tem certas experiências na vida que nos chocam pela veracidade de fatos, especialmente da forma como eles são trabalhados diante dos nossos olhos. Uma destas aconteceu nestas últimas semanas, da forma mais inesperada possível para o assunto que não me sai da cabeça.
Foi uma atividade de conscientização organizada pela turma de Técnico em Segurança no Trabalho da Faculdade Senac Blumenau. Era uma espécie de palestra interativa, onde somos jogados dentro da masmorra de um dos piores – talvez o pior – mal social do mundo: O bullying.
Não vou dar detalhes pois eles podem estar pretendendo circular com esta atividade por outras instituições de ensino (tomara que pelas escolas públicas também). Mas, da forma como a mensagem é passada a quem está ali, apesar de feita de forma simples, impacta. Por que não dizer, assusta!
Sai pensativo, disparando sugestões para os responsáveis. Não podia deixar de passar, aquilo mexera com meu pensamento profundamente. Quem nunca, em dado momento da infância, teve um dito pentelho no seu cangote fazendo chacota de você mesmo?
Os antigos dirão que, no tempo deles, não havia bullying. Meu pai, por exemplo, resolvia as paradas na força bruta. Quem se metesse com ele ou com um dos irmãos mais novos era arriscado a voltar com alguns roxos a mais para casa depois da aula na velha EEB Padre João Stolte, na pequenina e interiorana Botuverá (SC). Era o que havia para aqueles tempos.
Mas bullying não se resolve com sopapos. Pare de acreditar que violência se resolve com mais violência. Muito embora você feche os punhos achando que psicologia e diálogo são coisa de gente paciente. Mas não é o caminho, não mesmo. Bullying é trauma, é um rebaixamento social obrigado de um indivíduo para outro, apenas por popularidade, busca de inserção em um grupo ou, simplesmente, por prazer e preenchimento de um vazio interior nefasto. É doença, seja para a vítima quanto para o agressor… e também mata.
A crueza dos números sobre o bullying espanta, mas não é o universo completo. A Pesquisa Nacional de Saúde Escolar (PeNSE) de 2012, por exemplo, aponta que quase 30% dos estudantes brasileiros é envolvido por esta praga. Mais assustador, 20,8% deste total é de agressores. Em miúdos: Um em cada cinco jovens entre 13 e 15 anos pratica o bullying.
A prática, segundo outra pesquisa (Pesquisa de comportamento de saúde em Crianças em Idade Escolar – HSBC, na sigla em inglês), perde a força a medida que a idade do agressor avança. Mas o estrago já está feito na vitima. E mesmo que, com o passar da idade, esta prática suma, ela está aumentando assustadoramente. No Brasil, em 2015, o índice de casos chegou a 46,6%, sendo que em 2012 os números eram de 35,3%, segundo o IBGE.
E as estatísticas só aumentam. Outra pesquisa feita pelo jornal O Estado de São Paulo em 2014 em cinco grandes escritórios de advocacia apontou que os processos de pais contra colégios privados (leia-se bem, privados! Imagine a rede pública…) entre 2010 e 2013 aumentaram de 7 para 220. No ano da pesquisa, já tinham sido registradas até ali 174 ações judiciais. Seria uma ação a cada dois dias.
Mas são apenas números. Apesar de explicativos, eles são apenas referencias. Não são capazes de compreender todo o estrago psicológico na mente das crianças… E ainda, suas consequências a longo prazo.
O Bullying – termo inglês que, puramente, significa valentão, brigão – isola, agride, causa um dano psicológico tremendo na criança ou adolescente, ou quem for a vítima. Quase como tribos, os ditos dominantes – ou valentões, na linguagem cinematográfica – não tem pudor em humilhar, execrar, promover a exclusão entre seus influenciados. Toda a sorte em xingamentos e agressões, mentais ou físicas, são disparados.
E neste turbilhão, como você imagina que fica a mente do agredido? Imaginou? Pense pior do que isso…
Imagine em tendências isolacionistas, a perca do amor pela escola e pela vida e… claro, ele mesmo, o suicídio. Não que seja comum de todos os casos, mas neste, ele está a espreita.
E não só isso, os traumas do bullying são marcas de passado que podem afetar em longo prazo a vida da vitima. Experiências profissionais, sociais, amorosas, até mesmo o convívio com a família torna-se um fardo. Muitas vezes a vitima se esconde, seja em corpo presente ou em frases sentimentais com teor desalentador. Oculta o problema ao ponto de acha-lo normal.
A atividade que vi no Senac teve esse caminho, pelo menos aos meus olhos: Colocar-nos dentro da cabeça da vitima, esta que não suporta todos os traumas diariamente. Que vê sua vida social deteriorar-se diante dos olhos e da mente cansada das pancadas dos violentadores que, ainda com a tecnologia da internet, também proliferam seus atos pelas redes, duplicando o estrado.
E coibir como? Como evitar o bullying de se espalhar? Como punir e regenerar agressores? Como recuperar vitimas? Não é uma tarefa fácil nem aqui nem em qualquer lugar…
Por mais que digam o contrário, as escolas não estão preparadas para lidar com estes casos. Aplicam medidas simplesmente paliativas que não surtem efeito. Demoram-se a perceber o problema e, principalmente, ficam impotentes sobre o que fazer, especialmente, para evitar os atos dos agressores, que se vangloriam porcamente de contrariar a ordem da direção.
Esta educação que a escola não passa vem de casa. Pais omissos, distantes da vida escolar do filho ou filha que, a esta altura, não importa-se em tirar notas baixas ou se comprometer com os estudos e com o bom convívio social para com os colegas. Apregoa-se as imagens de descolado e fodão que a mídia e as músicas distorcidas de hoje lhe bombardeiam. E quem não segue seu grupinho ou é ignorado ou, claro, agredido com palavras e até sopapos. No fim, resta respeita-lo como um Hitler em tempos de guerra, para escapar dos insultos.
Parece ridículo dizer, mas é da natureza humana haver superiores e inferiores. Vem do tempo dos primatas, da escala social de animais como os chimpanzés. E o que assusta é que, mesmo com campanhas bem intencionadas e ações diretas como estas… Erradicar o bullying é uma tarefa impossível.
E para onde correr?
Infelizmente, tem quem ache graça ainda em se promover como o macho-alfa ou fêmea-alfa em cima dos semelhantes. Em todas as escalas do convívio social. A escalada do bullying parece algo sem volta, mas só não será uma lei entre as pessoas se, a partir delas, partir as iniciativas para coibir estes nefastos e tentar descobrir neles o vazio que lhes falta para provocar estes atos.
E para os agredidos, restam muito dialogo, tratamento por vezes e uma reaproximação social que comece devagar e só evolua, livre de vícios e detratores sempre prontos a atacar.
Você já sofreu bullying? Já teve o desprazer de ser agredido, chincalhado e rotulado diante de um grupo? Conte ai nos comentários suas experiências, se quiser. E não precisa se identificar…
A vida segue, o bullying não tem graça nenhuma, mesmo que tenha quem, nos seu vazio, que ache que tenha.