Nesta semana em especial, A BOINA vai parar em reverencia. Até sexta-feira veremos aqui, diariamente uma crônica com temática voltada ao Dia do Jornalista, que celebra-se no próximo dia 7. Serão cinco matérias especiais, quatro recordando histórias do mundo da notícia no Brasil e aqui em Blumenau e um especial sobre o futuro do nobre universo da informação e opinião.
São documentos importantes para compreender a história e elementos do nosso jornalismo através dos tempos. Desde as ondas pioneiras do Repórter Esso, o eterno primeiro a dar as últimas, passando pelo furo do escândalo Watergate, o jornalismo em tempos de enchente e o underground da investigação no lendário Documento Especial.
Fique conosco. Jornalismo e história é aquela combinação que cai bem, educa, descobre e dá nostalgia. Boa leitura.
Repórter Esso, o eterno primeiro a dar as últimas
Aqui fala o seu Repórter Esso, testemunha ocular da história, em edição extraordinária em homenagem aos jornalistas do Brasil!
Arrepia! E como arrepia! Quem sente o jornalismo na veia não deixa de se empolgar, especialmente, nesta chamada feita para TV de um dos mais clássicos – senão o mais clássico – noticiário da comunicação brasileira. Ao toque das trombetas, os ouvintes corriam e colavam as orelhas nas grandes notícias que estavam por vir da boca de Heron Domingues na transmissão do dia.
A grande vedete do jornalismo brasileiro em início da década de 40 era o Repórter Esso, testemunha ocular da história, o primeiro a dar as últimas, trazendo no bojo e sempre as informações mais frescas da United Press International (UPI). Especialmente naquela época, a Segunda Guerra era o grande cartaz, com todos os lances dos confrontos na Europa e no Pacífico.
O Repórter Esso nasceu sob a égide do American Way of Life. Foi ao ar pela primeira vez em 1935, em Nova York, produzido pela agência yankee McCann Ericsson. Foi o principal pilar de notícias que mantinha informados os países relacionados na política de boa vizinhança instituída pelo presidente Franklin Roosevelt naqueles idos.
Quando a guerra esquentou, o Repórter Esso virou instrumento obrigatório de informação sobre o conflito. Foi nesta hora, sob o apoio da Standard Oil Company of Brazil (posteriormente, Esso Brasileira de Petróleo), que o programa entrou na grade da Radio Nacional, indo ao ar pela primeira vez em 28 de agosto de 1941, precisamente as 12h55, com a locução primeira de Romeu Fernandes, anunciando o ataque aéreo alemão nas praias da Normandia.
Eram cinco edições diárias, com programas de cinco a dez minutos cada: Às 8h, 12h55m 18h30, 20h25 e 22h05. Concentrava-se, no começo, apenas nas notícias da UPI, o que levava o brasileiro a conhecer o que acontecia no mundo e, por conseguinte, nos EUA, sendo aproveitado também para uma espécie de propaganda do governo de Getúlio Vargas, por meio das informações fornecidas pelo então Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) do Estado Novo.
Na alça destas informações diárias estavam 14 países das Américas, sendo aqueles tempos a maior rede radiofônica mundial. Mas, apesar dos números grandiosos, as grandes histórias aconteciam mesmo dentro dos países em que era transmitido. No Brasil, a força com que era produzido e transmitido, somada a popularidade da Radio Nacional, o fez um noticiário extremamente confiável. Não tinha quem duvidasse das notícias por ele divulgadas nas suas cinco edições diárias.
Prova disso? Ao chegar o fim da guerra, a Radio Tupi, com base de informações via Associated Press (AP), deu a notícia de que o conflito havia cessado. No entanto, por um certo descuido ou cansaço compreendível de Heron Domingues, o locutor naquele período, a notícia acabou sendo dada pelo Repórter Esso na Radio Nacional um pouco depois da concorrente, confirmando o fato direto pela radio de Hamburgo, na Alemanha. As comemorações só começaram mesmo depois de Heron confirmar o fato solto primeiro na Tupi. Isto dois dias depois.
O próprio Heron contou sobre o clima da redação da rádio naqueles dias. Ele diz: Trabalhei no Repórter Esso de 1944 a 1962, sem um dia de folga. Levantava-me às 6h45 e voltava para casa à 1h30 da madrugada. Nos períodos críticos, dormia na rádio, que tinha uma cama na redação. Para se ter uma ideia da época conturbada em que vivíamos, no período em que fui locutor do Esso, houve no Brasil dez presidentes da república. Durante a guerra, dormia na Rádio Nacional com um fone no ouvido, diretamente ligado a UPI. Sempre que havia uma notícia importante, eles me despertavam, eu mesmo colocava a emissora no ar e transmitia a notícia. Para o fim da guerra, preparamos uma audição especial do Repórter Esso, em que a notícia seria dada fundida com o repicar de sinos. Com medo de me emocionar muito diante do microfone, gravei o início da transmissão: “Atenção! Atenção! Acabou a guerra”.
E assim foi… um trecho da audição abaixo:
Depois da guerra, o programa passou a dar notícias nacionais, anunciando como primeira bomba a deposição de Vargas. O livre tráfego nos corredores do Palácio do Catete, conquistado anteriormente como veículo de propagada do governo, permitia informações e coberturas detalhadas dos movimentos do governo. No ano seguinte, por exemplo, o Repórter Esso acompanhou a visita do presidente Eurico Gaspar Dutra aos EUA.
A confiança e credibilidade irrepreensíveis no Repórter Esso se deviam a prioridade na conferencia da informação em preferencia contra o furo. Claro que a procura por dar notícia primeiro vem desde os primórdios do jornalismo e ela também passou furos históricos, como o suicídio de Getúlio Vargas e a morte de Carmen Miranda, mas nenhuma notícia podia ser tratada com desleixo, como qualquer coisa, e deste tratamento e energia que nasceu a forma especial e icônica do Repórter Esso se apresentar diante dos ouvintes.
A modernização dos veículos não matou o programa tão cedo, pelo contrario. Em 1952, o Repórter Esso ganhou também um espaço na ainda jovem televisão, sendo apresentado pela TV Tupi. Curiosamente, a emissora da concorrente eterna da Radio Nacional, que continuou as audições dos programas até 1966, quando o Repórter Esso passou para a Radio Globo.
Na televisão, garantiu o mesmo sucesso e credibilidade do rádio, marcando os primeiros anos do telejornalismo. Interessante era o fato de não ser em rede nacional. Obviamente pelos anos primários da TV, nem era possível, mas ainda assim era apresentado em cinco cidades diferentes (além de Rio e São Paulo, também Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife), tendo cinco apresentadores diferentes.
Entre os apresentadores da TV, um de grande destaque era Gontijo Teodoro, que já tinha tido contato com o programa no rádio. Alias, na tarefa diária de ser o primeiro a dar as últimas, o Repórter Esso recebeu a fina flor dos locutores jornalísticos daqueles tempos. Além de Gontijo e do inigualável Heron Domingues, nomes como Kalil Filho, Luiz Jatobá e Roberto Figueiredo emprestaram suas vozes as notícias transmitidas pelo programa.
Foi ainda mais uma década de notícias nas ondas do rádio e TV. A modernização nos conceitos de transmissão de notícias e a concorrência com a televisão ajudaram a abreviar o tempo de histórias do Repórter Esso no rádio. Depois de 27 anos a frente da informação brasileira pelas ondas radiofônicas, o programa dava adeus numa noite de ano novo. Era 31 de dezembro de 1968.
Precedido pelas trombetas, Roberto Figueiredo entrou no ar dando sequencia com a escalada das notícias da edição das 22h05, a última do dia, do ano, da história. Nos destaques, as festividades do ano novo no Rio; o pronunciamento do então presidente Arthur da Costa e Silva sobre o momento nacional e o recentemente instituído AI-5; a condenação da ONU ao atentado de Israel por um atentado no Aeroporto de Beirute, no Líbano; e a missa de ano novo que seria celebrada pelo Papa Paulo VI na Colina Capitolina, em Roma.
Ai, foi hora de respirar fundo. Roberto começou a mensagem final e a recordar as principais notícias nos 27 anos do programa. Ai vem aquele sentimento do jornalista que sabe que uma peça histórica do nosso mundo da notícia está falecendo naquele momento. O choro veio a voz do locutor, tendo que colocar o locutor reserva, Plácido Ribeiro, para continuar a leitura. Figueiredo voltou a leitura um pouco depois, fechou o programa sem mais segurar o pranto. Acabou-se.
Na TV, a duração foi mais longa, até dezembro de 1970, no comando de Gontijo Teodoro, já pela TV Record. Despediu-se na mesma emoção, não tendo como ser diferente.
O Repórter Esso virou história, mas uma história bem vinda e inspiradora sobre como se deve fazer um jornal no rádio naqueles tempos. Enérgico, direto, sem meias-palavras, tratando a notícia como elemento vital, com o mínimo do mínimo de erro e zero de barrigada. Até nos furos ele fez por merecer estar nos anais.
Para qualquer um que se preze a ser jornalista, rever esta história é prestar reverencia a pioneiros nas veredas da informação brasileira. Será assunto de bancos acadêmicos por muito tempo, sem dúvida, e que deve ser prazerosamente estudado pelos futuros moços e moças da notícia.
Abaixo, para encerrar, uma aula de como fazer notícia no rádio (naqueles tempos, claro, embora não se mudou muita coisa) na voz de Heron Domingues… Pense só o privilégio de ouvir este professor:
André,
Fantástica esta postagem. Em nome do Repórter Esso que ouvi durante principalmente década de 1960, quero parabenizar você, minha filha e todos os jornalistas do Brasil pela passagem do seu dia em 07 de abril, Parabéns a todos.
O repórter Esso era ouvido por Rádio como se estivéssemos vendo os principais jornais na TV de hoje. Todas as residencias no horário do repórter Esso estavam atentos e ouvindo em frente ao seu rádio as noticias do Brasil e mundo.
Adalberto Day cientista social e pesquisador da história em Blumenau.