Há algum tempo, vimos atônitos e impotentes o arrastar doloroso das atitudes a serem tomadas com relação a um antigo casarão na entrada da Rua XV, marco do comércio da cidade por ter abrigado as instalações da antiga firma Probst & Sachtleben, além do Café de Berlim, casa noturna que utilizou-se do espaço em um passado mais recente.
O casario construído por volta de 1890 passa por um processo de “demolição parcial” para ter – ao menos – a fachada restaurada. O proprietário, famoso empresário do setor de autopeças da cidade, manteve por tempos uma constante queda-de-braço com os órgãos de preservação histórica do estado, responsáveis (ou não, pelo estado que a história tomou) pela preservação da casa histórica.
Enfim, respire fundo e ignore todos os fatos. O proprietário fez a sua festa, deixou o casarão ficar em frangalhos, somando-se ao Edifício América como mais um elemento de enfeiamento da “porta de entrada” do centro histórico. O TJ estadual passa por cima dos órgãos de preservação histórica estaduais e dá ganho de causa ao proprietário, e a história, que poderia ser “totalmente preservada”, vira um 90% de amontoado de entulhos prestáveis apenas para a reciclagem (se ela assim ocorrer).
Mau exemplo, daqueles que doem e demonstram a que ponto chegamos na erradicação do passado de um povo. Realidade que reflete-se num país inteiro dominado pela ignorância e arrogância dos tecnocratas que pilotam esta nau. Mas entre tanta decepção por relíquias históricas perdidas em Blumenau (e sem entrar no campo da política), eis que um bom exemplo pode muito bem ser contado, e o foi pelo bom amigo de A BOINA, Pancho Fresard.
Em sua coluna do Santa desta segunda-feira (05/08), Pancho conta sobre o casarão da década de 1930 pertencente a família Steinbach, ex-proprietária da Mafisa, e que integra o mais novo lançamento imobiliário da Construtora Cetor na Rua Conrado Balsini, no Centro. O casarão, construído em técnica enxaimel, ficou abandonado por anos no terreno ao lado da Unisociesc, até encontrar nova vida como um espaço de convivência entre os moradores do novo condomínio.
E, como se não bastasse, segundo o que Pancho apurou com o empresário Adilson Torresani, da Cetor, o fator “restauração e novo uso da casa” por si só deu um bom impulso as vendas, tendo a promessa de não derrubar o imóvel como fator determinante para que a incorporadora pudesse ocupar o terreno. E mais: a casa não é (eu disse NÃO É) tombada pelo patrimônio histórico. Poderia ser demolida por completo, mas promessas saudáveis e idealismo seguro deram um novo visual e uso a uma residência clássica.
Quer mais? Esta não é a primeira vez que uma preservação desse porte acontece. Em 2017, para edificar o Ingo Hering Residenz, a Melchior Barbieri teve de preservar o casarão do empresário Ingo Hering, que fica no mesmo terreno do condomínio e – ao contrário do casarão Steinbach – é tombado pelo patrimônio histórico. Tinha, portanto, de ser restaurado e mantido. E isso tudo mesmo com as contestações dos moradores do Bom Retiro, que à época não queriam mais um residencial destas proporções na região.
Preservação do patrimônio sempre dá urticária das brabas em qualquer construtora ou proprietário. Custa caro e sempre tem seus caminhos possíveis: ou é um bom exemplo ou, visto por um escrupuloso da especulação imobiliária, é algo desnecessário. “Por que manter uma velharia que me custaria mais para manter?” “Deixo cair aos pedaços até que não seja possível restaurar?” Um problema que não é recorrente apenas em Blumenau, mas em muitas partes do país, ainda mais com os ataques aos setores culturais do Brasil.
Manter intacta a historia edificada, dando-a novos usos e preservando seu passado, deveria ser a escolha obvia em qualquer novo projeto em uma casa histórica. Tombada ou não, preservar deveria ser ato que partisse da iniciativa própria dos seus construtores, não apenas em ganhos monetários com a mistura do clássico com o moderno. Tem a ver com história, com passado, com memória de uma cidade.
Enquanto refletimos sobre o tema, os contrates permanece. De um lado, o bom exemplo sem nenhuma obrigação de lei. Do outro, a queda-de-braço com a lei em busca do que “for melhor” para a especulação imobiliária. Doi tocar na ferida, mas se não for agora um rico passado em construções e em quaisquer outros elementos vira entulho em alguma basculante por ai.