Essa é mais uma daquelas histórias curiosas que me faz coçar a cabeça para pensar até aonde estamos certos em pleitear um produto que não é nosso como item gourmet de nossas mesas. Claro que devo arrumar uma briga das boas com quem hoje faz esta iguaria em nossa região, mas se me apresentarem uma história mais plausível, agradeço. Não vamos desinformar, mas contar a história na raiz, natural.
Meu bom primo e doutor em biologia, Harry Boos Jr., está em excursão pela Europa junto da família, curtindo um natal-ano novo bem diferente do usual. Já passaram por várias cidades em Portugal, onde estão baseados, e agora descobrem alguns dos cantos mais pitorescos da Alemanha, como Dresden, Berlim e Leipzig, antes de parar na simpática Braunschweig, na baixa Saxônia.
Antes de viajar, Harry Jr. foi curto e reto na “denuncia” que queria fazer direto da cidade onde Dr. Hermann Blumenau passou seus últimos dias: a tão afamada linguiça Blumenau, produto cobiçado e sonhado a ser marca registrada da gastronomia do vale, já existe há muito tempo nas mãos dos alemães. Trata-se, naturalmente da linguiça braunschweiger, com aspecto, ingredientes e sabor idênticos ao produto regional.
É claro e mais do que sabido que muito da culinária tradicional germânica do Vale foi trazida na bagagem pelos imigrantes aqui instalados a séculos. Sua mais antiga fabricante no Vale, a Olho, tem mais de 80 anos de experiência na iguaria que, por sí só, é seu cartaz para um país inteiro que aprecia produtos com aquele toque colonial único. A empresa faz isso com primor até hoje, tornando-o nosso produto corriqueiro nestes últimos tempos.
A linguiça como a conhecemos tem parte neste universo gastronômico todo nosso, integra inúmeros pratos típicos e modernos e chama atenção de apreciadores de várias partes do Brasil. Há algum tempo, é revindicada como patrimônio cultural catarinense, embora a normativa aprovada em Blumenau já lhe seja suficiente, segundo o órgão estadual.
No entanto, até aonde a celebrada linguiça Blumenau é “toda nossa”? Países como a Alemanha, Itália e Espanha dominam essa arte dos produtos embutidos há séculos, tanto que muitos dos seus tipos originam-se da forma de preparo e ingredientes típicos de cada região. Parece que estou explicando o bê-a-bá da linguiça, mas se o tipo Blumenau tem suas origens na iguaria de Braunschweig, não nos daria, naturalmente, o ineditismo da criação, mas sem dúvida nos deixa um rótulo todo nosso: o de um produto legitimamente colonial com raízes germânicas mais do que comprovadas.
Exclusivo? Não… Mas nosso e remetente ao tempo de colônia, claro! Vale a indagação de Harry Jr. e nada que mude o sabor e simbolismo culinário da boa e velha linguiça braunschweiger… ou melhor, Blumenau, em tudo onde ela é aplicada. E quem mais histórias venham para o bate-papo continuar rico e, por que não, saboroso.