Em tempos da Primeira Guerra Mundial, os versos e declamações de Gabrielle D’Annuzio, somados aos versos apaixonados do hino nacional, inspiraram uma legião de italianos nos tempos difíceis do conflito. Em meio as dificuldades, enquanto alguns ficavam na bota para enfrentar os tempos pesados das batalhas enquanto outros cruzavam o Atlântico em busca de novas oportunidades, sem esquecer das coisas da terra natal.
Italiano não suporta a ideia de ficar longe, não estar em comunidade. Celebrar e “lavorar” junto vem da sua criação, desde os tempos de vindima e no trabalho das pequenas vilas até as grandes festas e a correria nos grandes centros, na própria Itália ou onde um ou mais italianos ou descendentes estiverem.
Agora… quando esta celebração diária, esta felicidade, é cortada da noite para o dia? A vibrante Itália teve que passar nos últimos dias por um dos revezes mais doloridos de sua história. As ruas de Roma, os rios de Veneza, as curvas apaixonantes de Verona, o Coliseu, o Vaticano, Milão, Napoli, Sicília, o Calccio, Monza, Maranello… tudo vazio, quase inabitado, a crueldade maior que um vírus pode causar a um povo e sua cultura: o coronavírus na sua face mais nebulosa.
É assustador, sim e como. O mundo está se recolhendo por momento para vencer um inimigo invisível, cercado por descrentes e ignorantes, que traz seu medo e a necessidade de atitudes drásticas para trazer aquela certa sanidade ao mundo. A terra da bota escorregou em seus métodos, e junto de Alemanha, França, Espanha e outros, é um dos epicentros do Covid-19, o mais afetado em suas rotinas.
Mas, você recorda do que disse no segundo parágrafo? Italiano não suporta essa ideia, mas sabe do perigo de estar na rua, em grupo andando pelas ruas onde o perigo espreita. Não um perigo de morte imediata, mas temido de qualquer maneira. Só que, o que você faz quando está isolado nessa situação? Se resigna no seu canto remoendo a saudade… ou abre a janela pra gritar ao mundo que não perdeu a esperança?
De repente, as janelas italianas abriram, e delas não saiu amargura e medo, mas música, muita música. Tinha de tudo, de óperas e clássicos a bandas de Rock rasgando o vento e levando alegria as ruas vazias. Os mais inspirados, colocaram la tricolori nas suas varandas e cantavam exaltados o hino italiano, como uma espécie de alento e esperança brotada de janelas e sacadas de condomínios e prédios simples.
E eu digo, se em algum momento a Itália pareceu subjugada, ela sempre achou força entre seus cidadãos para inspirar o mundo. Nas suas poesias, no seu esporte, na sua arte e nas suas histórias fantásticas. Não é desta vez que nós veremos a terra da bota de joelhos, ela nos deu uma lição de como um vírus semelhante a gripe e que pode ser curado e prevenido não nos pode tirar o sorriso e a vida que ainda nos cerca, apesar de todos os pesares de intolerância e ignorância do mundo.
É preciso pensar positivo, agir contra o vírus, mas sem perder o sorriso. Cumprimentar de longe, mas sem perder a inspiração e a alegria comum dos seres humanos que, mesmo abaixo das incompreensões, do medo e das superficialidades, fazem o dia ficar mais leve. É passageiro, vai passar, com cada um fazendo o seu sem esquecer de sorrir e inspirar quem está do lado.
Como as grandes lendas dos deuses romanos da antiguidade, eis os italianos dando outra lição de como não perder a inspiração diante das adversidades. E para nós, não é preciso uma sacada para cantar. Basta abrir o coração e deixar a inspiração e a autenticidade do ser correr solta para cada um que estiver com o semblante de temor. Tudo vai passar e o resto, ah… o resto é literatura.
Enquanto isso, façam música, italianos! Siamo tutti con te, amici!
(Fonte: O Globo)
(Fonte: Global News)
(Fonte: The Guardian)