Certo dia, a caminho da rádio, observava em volta o correr das pessoas no começo de um novo dia. Eu costumo fazer isso meio que involuntariamente, quase como se a gente pensasse o que se passa na cabeça e na rotina de cada um, da mais comum a mais vazia, esperando um futuro chegar.
Perto de casa, em um ponto de ônibus, me deparei de relance com duas senhoras, uma ao lado da outra, sem trocar olhar nem palavra, vidradas no que a telinha a frente delas dizia. Intrigado, me fiz recordar de outros tempos onde até mesmo exames médicos eram motivo para puxar papo no rumo do coletivo.
Pequenos prazeres, pequenas conversas e o nosso redor tão real quanto. Quando foi que perdemos a noção de realidade das coisas? Em um tempo como o nosso, onde a IA abraça cada vez mais funções e os influenciadores emprestam cada vez mais sua sanidade e tempo para exibir perfeições e coisas, parecemos cada vez mais fechados no mundo pequenino dos celulares em nossa mão.
Eu já cansei de pregar essa redação por aqui e nas minhas próprias redes, mas é de assustar e agoniar-se a tanto ver quase que o resumo de um dia de alguém entre stories e o rolar de um feed sem pretensão. As redes viraram mais que um negócio lucrativo (e, por vezes, tão mal feito), mas um mundo distante da realidade a nossa frente. O pôr-do-sol do exterior parece não ter mais o valor do que o término de um dia diante da nossa retina.
Os corpos perfeitos, produtos, eventos glamorosos, fofocas, as temidas “fake news” que colocam qualquer um em patamar de “entendido de sofá”, a sanha das curtidas e comentários, as relações humanas resumidas no unfollow, no bloqueio e no seguir. Tudo se virtualiza, e o mundo palpável a nossa frente, inútil e sem graça, muito difícil de se viver como outrora.
E pedir para desligar estas telas todas? Impossível! É tarde demais até mesmo para usar delas suplicando um olhar a nossa volta, como nos tempos antigos. Abraçamos a tecnologia social sem medir a consequência das verdadeiras relações sociais a nossa volta, e reverter tudo isso tornou-se impossível, inexistente, sem esperança.
Se pudesse pedir que, um dia, os celulares da terra simplesmente se desligassem por um dia, sem aviso, talvez seria masoquismo meu, mas a última chance de pedir aos humanos hipnotizados em volta que desviem-se da fantasia das telas para o mundo de verdade, aquele feito de vento e carne quente, dos abraços e risos que nenhum emoji conseguia assimilar.
Sonhar com dias assim? Não custa, mas pratico minha higiene. Quem quiser me encontrar, procure menos no meu virtual e mais pelos caminhos a volta. A gente precisa de menos telas e mais mundo. O mundo não é uma tela mesmo que ela assim pareça, e nada substitui a realidade do que ainda há de são neste mundo.
Menos tela, mais mundo, por favor!
Eu estou triste como a tecnologia vai engolir as nossas vidas. As empresas tecnológicas vão usurpar-las, tudo que faremos terá algum tipo de ligação com elas. Já imagino quantos problemas sociais irão existir, já que estarão cada um no seu quadrado, cada vez mais isolados. Nem as crianças brincam mais. Mas fico feliz que não sou o único que tenho esse pensamento. Espero que haja milhares de pessoas que pensam igual a nós.
A tecnologia trouxe alguns benefícios? Sim. Mas nem tudo que é novo, vem para fazer o bem.