Aquela velha história que tudo que vem dos Estados Unidos pega por aqui e entra no nosso cotidiano, por vezes, é mais certa do que outra coisa. Todo mês de outubro, por exemplo, estamos lembrando cada vez mais do dia 31 como sendo o Halloween, sem que esta data seja naturalmente de nossa cultura. Isto para citar um exemplo apenas, sem neste bolo contar os fast-foods, as lojas de departamentos, os blockbusters, a black friday e tantos outros. Pequenas heranças importadas dos States e que, sem querer ou não, imergiram em nosso dia-a-dia tupiniquim.
No entanto, em meio a pesquisas para a terceira parte da série de publicidade aqui d’A BOINA, encontrei uma história inusitada sobre um item tão comum a realidade americana que, ao pisar no Brasil, não pegou de maneira alguma. Um pouco pela ingenuidade de quem planejava vender e um pouco também pelo que o brasileiro é bem acostumado a ver no prato no dia dia, bem diferente da chamada comida de doente: Este é apenas o conto curioso de como a clássica sopa em lata Campbell’s não deu certo no Brasil.
Imortalizada pelo gênio da Pop Art mundial Andy Warhol, em 1962, a lata de sopa Campbell’s é tão corriqueira na prateleira das cozinhas dos EUA quanto as demais comidas prontas. A diferença é que marca procura – até hoje – vender a ideia de que sopa é muito mais nutritiva e saudável do que uma caixa de spaghetti ou outra comida congelada, ou até um lanche fast-food tão comum por la (talvez até seja, excluindo-se os conservantes, claro). Não tanto, ela se auto-intitulou o alimento favorito da América. Ao menos, a do Norte, se for constar.
Sr. Campbell, suas latas e o sucesso
A marca nasceu antes da sopa. Em 1869, o industrial do ramo alimentício Joseph A. Campbell associou-se ao fabricante de latas Abraham Anderson para a fabricação em massa de enlatados de tomates, vegetais, condimentos, geleias e carnes em pedaços. A fábrica tinha lugar na modesta e complicada cidade de Camden, no estado de Nova Jersey. No entanto, divergências nos negócios separaram Campbell de Anderson em 1876, e o empresário procurou então um novo sócio, Arthur Dorrance, para a constituição de uma nova fábrica de alimentos, conservas e condimentos.
Quase 20 anos depois, em 1895, surgiam na empresa as famosas latas de sopa de tomate e as sopas concentradas, uma técnica desenvolvida pelo químico John Dorrance, sobrinho de Arthur, que consistia em retirar a água do alimento para sua conservação. Para prepara-lo, basta apenas adicionar a mesma medida da lata de água quente a mistura e pronto: Sopa quente e sem esforço. A tradicional coloração em vermelho e branco das latas foi sugestão de Herberton Williams, executivo da empresa e que inspirou-se nas cores do time de futebol americano da Universidade de Cornell, da qual era fã.
O negócio era um verdadeiro sucesso, além de um alimento barato – custava apenas 0,10 centavos de dólar – as sopas eram de preparo simples, sempre a mão de quem tinha pressa, de quem não sabia muito bem cozinhar, de quem ia acampar, de quem não sabia o que ia fazer para as refeições e por ai vai. Era apenas mais um elemento do dito american way of life que se incorporava a realidade das famílias de geração em geração. A Campbell’s tornou-se uma marca valiosíssima e, nos anos 60, começou a se espalhar pelo mundo, começando pelo Canadá, em 1965.
No Brasil: Uma tigela intangível
Era 1979, e o Brasil ainda vivia os restos das descobertas das facilidades do dia-a-dia que o milagre econômico tinha permitido no início dos anos 70. Produtos e eletrônicos americanos e europeus entravam pelo nosso país, muitas vezes por marcas brasileiras que os reproduziam e lançavam dentro do país, uma vez que as importações em larga escala eram proibidas. Foi nesse cenário incomum que a Campbell’s resolveu que era hora de colocar a colher na tigela de sopa do brasileiro.
Quem contou esta história com ricos detalhes foi o já consagrado administrador de empresas e escritor Max Gehinger, famoso pelas colunas na CBN e pelas séries especiais no Fantástico, na Rede Globo. Gerhinger viveu esta história na pele, quando trabalhava na antiga Fábrica Peixe, que ganhara a concorrência para fornecer polpa de tomate para a produção da sopa Campbell’s. Este conto a gente reproduz aqui, dando seus devidos créditos (veja a história contada por ele no site da revista Exame)
A Campbell’s preparava-se para lançar-se a aventura de fazer sucesso no Brasil, mas para evitar riscos demasiados, a empresa se associou a já internacional Gessy Lever para a produção de sopas no país. Uma pesquisa prévia foi feita para compreender a aceitação do produto no país. Uma pergunta simples: Dona de casa, você compraria a sopa Campbell’s?.
Inocentemente, quem respondia dizia que adquiriria o produto com certeza, talvez fascinadas pela facilidade que a latinha vermelha e branca traria. Era o que a Campbell’s precisava para dar o start na operação. Tudo armado, produção para começar, campanha publicitária em TV, rádio e jornal (estrelada pela ainda queridinha do país à época, Lucinha Lins) e aquela ansiedade disfarçada de positivismo no ar.
No entanto, para quem imaginava que veria latas de sopa em cada lar brasileiro e uma sopinha quente a qualquer momento do dia na mesa do trabalhador tupiniquim espantou-se. Depois de dois anos tentando vender seu produto no Brasil, em outubro de 1981, a Campbell’s retirava-se de circulação dos supermercados. O resultado comercial foi um verdadeiro fracasso, segundo os cálculos apresentados pelo próprio Gehinger: de cada 100 latas produzidas, apenas uma – isto mesmo, uma! – era vendida.
No jargão comercial bem dito, o produto acabou encalhando e os investidores terminaram seus dias se perguntando o que tinha dado de errado em algo tão certo.
Traída pela boa vontade, e pelas donas de casa
Explicações? Algo que se compreenda? Depois do fiasco, a Gessy Lever fez uma nova pesquisa perguntando por que as donas de casa não compraram a sopa Campbell’s. A resposta pode soar surpreendente se comparar-mos com o que vimos anteriormente, as donas de casa consultadas afirmaram, de forma mais generalizada, dos tantos motivos que apareceram um deles foi o responsável por dar uma rasteira na insipiente multinacional: A cordialidade do brasileiro em responder pesquisas.
Quem aceitava responder a pesquisa queria agradar quem perguntava ou não ser alguém de opinião diferente do grupo, um clássico do nosso hábito que se repete dia a dia, especialmente em tempos de eleição quando algum candidato está a frente em pesquisas. Quando o produto entrou na prática na cultura brasileira o resultado contrariou os números que as pesquisas iniciais davam, muito mais pelo hábito brasileiro do que por alguma estranheza com relação a sopa em lata.
Dois fatores mais entraram em ação nessa hora: Aquela máxima que quem toma sopa é gente doente, em recuperação de doença ou que não use dentadura, o outro é aquele que vai contra a vaidade da dona de casa brasileira, afinal não serve para a família uma sopa que elas mesmas não haviam preparado. Diferente dos pacotes de sopa clássicos de Maggi e Knorr, que ainda permitem incrementos caseiros, a Campbell’s só necessitava de água e nada mais.
O case de insucesso da Campbell’s é um bom exemplo de como uma pesquisa de marketing malfeita pode contribuir para um fracasso comercial sem precedentes, podendo muito bem ser usado em aulas e palestras de administração e marketing em qualquer lugar do país. No entanto, o escorregão da sopa em lata no Brasil é um caso curioso de como um elemento yankee pode não pegar no nosso dia-a-dia, diferente de tantos outros que, hoje, fazem parte até mesmo de nosso idioma e hábitos.
Talvez na nossa atualidade, repensando conceitos de lançamento e outras estratégias, a Campbell’s poderia dar certo no Brasil, já que a geração da comida rápida é algo cada vez mais globalizado. No entanto, em tempos de crise e incertezas econômicas, e vindo de uma história fracassada, a tradicional latinha de sopa americana talvez não pense tão cedo e colocar a colher dentro de nossas tigelas.
Campbell’s no Brasil? Ou importada, ou comendo no exterior… ou admirando comerciais americanos e a clássica obra de Warhol. Fora isso, nada mais.
Qual era o valor de venda na época?
BOa pergunta, Tatiani… claro que o valor era em cruzeiro, ai fica bem mais difícil precisar.
Fico te devendo essa ^^
Teve uma canja em lata otima. no Brasil, do frigorifico
Wison. Vinha até com uma coxinha da asa.Tomava sempre Era excelente, brasileira e muito mais gostosa do que as sopas Campbell.
Quando fazia a faculdade entre 77 e 82 tomei muita sopa. Adorava a Camphbell era muito prático chegar da aula e fazer, mas era muito caro na época, uma lata dava para comprar 4 ou 5 pacotes da Knoor.
ola,sinceramente o valor que eles cobram,e absurdo,essa deve ser produtos importados.Mas se voces voltarem a produzir no BRASIL,claro mais barato produzir localmente
Eu adorava! O problema era o preço pois uma lata equivalia a três sopas maggi. Éramos pobre, outra dificuldade!