Antigamente: A Cia Jensen, do leite pasteurizado a história

A prosperidade de um império. A divisão do Leite Frigor da Cia. Jensen, nos anos 50 (Companhia Jensen)
A prosperidade de um império. A divisão do Leite Frigor da Cia. Jensen, nos anos 50 (Companhia Jensen)

Não beba leite crú nem cozido. Beba leite pasteurizado

No casco das clássicas garrafas do Leite Frigor esta singela frase estava estampada. Muito mais do que uma instrução para a saúde do consumidor, ela resumia o avanço que, à época, significava contar com o processo de pasteurização do leite em uma indústria blumenauense.

Era apenas uma das marcas da potencia que foi um dia a saudosa Cia. Jensen Agricultura, Indústria e Comércio, ou simplesmente Cia. Jensen. Que há cerca de 30 anos fechou as portas e se tornou página vibrante da história industrial de Blumenau.

A empresa no início do século XX. Além da própria empresa, produtores locais abastecem a empresa com a matéria-prima dos produtos (Cia. Jensen)
A empresa no início do século XX. Além da própria empresa, produtores locais abastecem a empresa com a matéria-prima dos produtos (Cia. Jensen)

Fundada em 1872 por Rudolf Jensen, a empresa estabeleceu na Itoupava Central muito mais do que um empreendimento agropecuário, mas também como um ponto de convergência de produtores locais, que contribuíram no fornecimento da matéria-prima dos produtos fabricados pela companhia.

10540626_722266331214187_5806727839795801431_nAves, bovinos, suínos, arroz, leite, era uma saudável mistura de produção com economia familiar, que fez aquele pedaço da região mais alemã da cidade viver um nostálgico período de prosperidade, para produtores e funcionários da firma.

Mas a grande marca da Jensen na história estava mesmo na área de laticínios. Em 1937, a empresa introduziu uma das inovações do setor na época: O processo de pasteurização do leite e derivados, que consiste no aquecimento e resfriamento repentino do leite, neutralizando as bactérias e microrganismos presentes do produto ainda puro. Foi um salto em qualidade e confiança na marca, que tornou o já popular Leite Frigor ainda mais famoso nos limites citadinos.

Os anos passaram, o trabalho seguiu adiante e prosperando, e o comando da firma passou de pai para filho. Com o falecimento de Rudolf, o filho Guilherme ficou a frente dos negócios, cada vez mais conhecidos na cidade e fora dela. Uma curiosidade era que Guilherme Jensen tinha como sócio-diretor e grande amigo com o então deputado Pedro Zimmermann, ambos imortalizados nas duas principais vias da Itoupava Central.

O sucesso do empreendimento pode ser visto com clareza em um interessante documentário gravado por volta de 1965. Não se sabe a que fim ele foi feito ou quem o produziu, mas é um importantíssimo registro das atividades da Companhia nos anos de auge, e um raro documento em vídeo da Cia. Jensen:

[youtube https://www.youtube.com/watch?v=12rJlT6wEwU]

Além da empresa, os funcionários e a comunidade da Itoupava Central tinha a disposição uma pitoresca sede social, para festas e competições esportivas. Foi nela que nasceu o Frigor E.C., que assim como o Amazonas Esporte Clube, era um time proletário formado por trabalhadores da Cia. Jensen e que, ocasionalmente, competia na liga citadina de futebol, na maioria das vezes na segunda e terceira divisões.

A equipe do Frigor E.C. em 1957. Um time proletário como o Amazonas, do Garcia (Almanaque do Vale)
A equipe do Frigor E.C. em 1957. Um time proletário como o Amazonas, do Garcia (Almanaque do Vale)

Quem é mais de idade em Blumenau não tira da memória o chegar do caminhão da Frigor pela manhã bem cedinho, logo na hora do café. Cada um dos clientes da Jensen tinha um cartão mensal com as entregas de leite registradas.

A garrafa de Leite Frigor, sempre entregue e recolhida nas primeiras horas da manhã de uma Blumenau de outros tempos (Cia. Jensen)
A garrafa de Leite Frigor, sempre entregue e recolhida nas primeiras horas da manhã de uma Blumenau de outros tempos (Cia. Jensen)

A garrafa era retornável, feita em vidro grosso e com o rótulo pintado no casco. Muitos pela cidade ainda guardam orgulhosos um exemplar do vasilhame como uma peça de recordação de tempos dourados e cafés da manhã inesquecíveis.

Mas a história de prosperidade se tornou pesadelo nos anos 80. A empresa entrou em uma espiral decadente e a competitividade com marcas maiores, somada ao início da crise econômica e as consequências das enchentes, tornaram a situação financeira da Jensen delicada.

As dívidas chegavam a equiparar-se com o capital total e não se tinha interesse de procura de um grupo que pudesse continuar as atividades. Em 1984, foi decretada a falência da Companhia, e 112 anos depois o sólido empreendimento dos Jensen estava de portas fechadas para sempre.

A reportagem que prenunciava a falência foi assinada pelo lendário Luiz Mund, com imagens do pai da chopmotorrad, o fotografo Ingo Penz, para o extinto jornal O Estado. Veja abaixo:


O que restou da Cia. Jensen, nas cercanias da Rod. Guilherme Jensen, Itoupava Central. (Reprodução)
O que restou da Cia. Jensen, nas cercanias da Rod. Guilherme Jensen, Itoupava Central. (Reprodução)

Nada que apague a história e a importância da empresa para a cidade-jardim. Exemplo do empreendedorismo e iniciativa blumenauense, a Cia Jensen, volta e meia, é sempre lembrada por muitos como uma indústria forte, de produtos marcantes e de um leite que entrou para o imaginário popular de uma época. Até uma página do Facebook conta em imagens alguns dos momentos da empresa, além de reunir ex-funcionários da Companhia.

Nada mais justo do que reverenciar Guilherme, Rudolf e os que continuaram até onde foi possível esta empreitada, encerrada pelas questões da vida empresarial, mas jamais esquecida pelas questões históricas que nos cercam. Tudo regado ao bom e puro leite pasteurizado…nem cru, nem cozido…pasteurizado!

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