O Natal passado

Eu tenho um velho costume em casa em toda a época de Natal: minha mãe guarda na discoteca dela um disco de canções natalinas interpretadas pela voz melodiosa e romântica de Julio Iglesias. A gravação original é de 1976 e a prensagem que temos é de 1984, ainda com a pequena etiqueta da Lojas Hering presa nele.

Nem vem ao caso quantos cruzeiros ele custara lá em 1984. Certeza é que ouvir Julio dar vida ao Natal através das canções que interpreta a cada faixa tornou-se uma tradição de cada quadra natalina aqui em casa. Não ouvi-lo é como passar reto pela cor e poesia que esta época traz, independente dos tempos que vivemos.

Alias, olhando para o velho disco do Julio, me faz pensar intensamente como, neste período do ano, o saudosismo floresce fortemente em muitas pessoas que olham páginas passadas do Natal com saudades rasgadas. Elementos, presentes, datas inesquecíveis, aquele clima único de fim de ano que permeava a infância perdida em algum lugar.

Dezembro era o último mês de aulas, e a despeito de um boletim escolar atestando a passagem sem exame (primazia minha e de muitos amigos leitores), o mês já começava com a expectativa dos atos derradeiros no corredor escolar. Amigos secretos pipocavam, camisas eram assinadas e praticamente não havia aula, apenas um rodar fraterno de crianças e adolescentes esperando o sinal final do ano letivo.

Durante os dias antecedentes do Natal, a criança ainda permitia-se deixar levar pela magia imaginária da época, com a crença velada de que um velhinho traria os sonhados presentes ainda na noite de 24 de dezembro. Cada família celebrava a sua maneira: com ou sem ceia, mas com árvores iluminadas, presentes e sorrisos de emoção, sem esquecer a missa daqueles dias, ainda mais festiva.

Talvez por não querer cair nesta lógica que me afastei um pouco do LP de Julio, para não deixar levar-me por lembranças do que já foi e forçar-se a olhar para frente. Inevitável, o Natal provoca nossas lembranças mais ternas e nos faz voltar, sorrindo em flashes mentais, a inocência e gostosa ansiedade de dias entre presentes, praia e clima de festa sem neve.

Pode soar prejudicial negar o saudosismo como também vive-lo por várias vezes. A verdade é que o Natal nos faz voltar a ser, de alguma forma, aquele ser humano mais leve e tranquilo dos tempos escolares, da infância e da doçura de momentos inesquecíveis. O que importa, e torço para isto, é que na memória de você estejam boas lembranças, que corram lágrimas mas que, sobremaneira, te façam pensar em um Natal melhor hoje, ano que vem e por ai afora.

Não é crime lembrar, mas cultive tradições e momentos no hoje para que gerações que nos cercam hoje também tenham esta mesma sensação, não se perdendo na névoa do frio e indiferença sentimental destes dias que vivemos. Se é a reflexão para o bem que o Natal nos convida, por que não o fazer além de pensar em presentes e ceia?

Recordar é viver, e viver o hoje é tão forte e belo quanto o ontem que ficou e marcou. Enquanto isso, roda o LP do Julio nas minhas costas, não resisti e voltei no tempo olhando pra você e dizendo…

Feliz Natal!

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