Apollo-Soyuz: O encontro de dois mundos no espaço

Ilustração sobre o acoplamento das naves Apollo e Soyuz no espaço. Foi em 1975 que americanos e soviéticos realizaram um encontro histórico em órbita, abrindo caminho para a cooperação internacional nas pesquisas espaciais. Mesmo num ano onde a Guerra Fria estava no auge (Reprodução)

De um lado, Baikonur, do outro lado, Cabo Canaveral. De um lado, cosmonautas, do outro, astronautas. De um lado, o comunismo, do outro, capitalismo. Quando voltamos na história em um determinado ponto da Guerra Fria é difícil imaginar que os mundos opostos de EUA e URSS fossem, em algum momento, dar as mãos e trabalhar juntos em alguma atividade, seja esportiva, econômica, científica ou o que fosse. E isso ainda mais improvável se tratando do mundo espacial.

Em 1975, a corrida espacial já tinha um vencedor. Mesmo com os soviéticos saindo a frente com o Sputnik, em 1957, e ampliado a vantagem com Laika, no mesmo ano, e Yuri Gagarin, em 1961, os americanos investiram rápido e pularam a dianteira quando Armstrong, Collins e Aldrin foram a Lua no audacioso Apollo 11, em 1969. A URSS bem que tentou, mas parecia ter perdido a mão em domar o espaço e chegar ao satélite que, para eles, virou um sonho eterno.

No entanto, naquele ano em especial, alguma coisa aconteceu que fez os programas especiais de ambos – Apollo e Soyuz – se aproximarem num encontro histórico que, por um momento, fez dois mundos serem apenas um, além de ser um marco na cooperação internacional com relação a exploração espacial: De um lado, a simbolicamente chamada Apollo 18, do outro, a Soyuz 19, a Apollo-Soyuz na sua única e histórica missão.

O rover lunar (também conhecido como jipe lunar) em trabalho na Lua durante a Apollo 17, a última missão tripulada ao satélite, em 1972. No ano seguinte, a NASA colocava em órbita o Skylab, na continuidade dos seus trabalhos no espaço (Reprodução)

A ideia inicial para uma missão espacial conjunta partiu do então presidente Richard Nixon, em 1970, tendo como objetivo verificar se ambos os países poderiam se ajudar mutuamente, especialmente em caso de um acidente. Até aquele momento, profissionais do espaço americanos e soviéticos só se encontravam mesmo em convenções internacionais, ainda com aquele clima amistoso de paz e educação vinda de casa.

Nos EUA, o programa Apollo colhia os louros da chegada à Lua e continuava explorando o espaço e o satélite nas missões seguintes. Mesmo com o escorregão homérico no Apollo 13, em 1970, a NASA já havia conseguindo executar seis missões tripuladas para experimentos científicos e testes em solo lunar. Teve de tudo, tacada de golfe, jipe, tropicão e até dança. Em 1972, o programa foi encerrado com a Apollo 17, dando lugar aos trabalhos no Skylab, o laboratório espacial lançado no ano seguinte.

Os cosmonautas Georgi Dobrovolski, Vladislav Volkov e Viktor Patsayev, vitimas de um acidente trágico na Soyuz 11, em 1971. Mesmo saindo à frente na corrida espacial, a URSS nunca conseguiu colocar um homem na Lua, embora mantinha-se bem próxima deles nos trabalhos no espaço (Reprodução)

Já nos lados soviéticos, o programa espacial apoiado nas naves Soyuz bem que tentou, mas não conseguiu colocar nenhum homem na Lua, apesar de várias tentativas e testes nos anos 60. Sendo assim, os trabalhos se concentravam nas estações espaciais Salyut que eram colocadas em órbita no decorrer dos anos. Apesar de algum avanço diante os americanos, quatro cosmonautas morreram em missões tripuladas em um intervalo de oito anos, além dos problemas que o programa enfrentava.

No entanto, nada impedia uma missão entre ambos. Dos países desenvolvidos, eram os programas espaciais mais avançados e faltava apenas um estalo para ambos trabalharem juntos pela primeira vez. E em que momento: 1975 marcava a tomada final do Vietnã do Sul pela guerrilha vietcong, sem contar tantos países que entravam em convulsão ou conflitos armados entre movimentos comunistas e democráticas. A Guerra Fria estava no seu auge e qualquer movimento pacífico entre EUA e URSS era um sinal de esperança em dias melhores.

Insignia da missão Apollo-Soyuz. A NASA ressurgia, simbolicamente, o nome da missão que levara o homem a Lua para este trabalho histórico junto dos outrora rivais soviéticos (Reprodução)

Longe da poesia, os trabalhos para uma missão conjunta já começavam a viver os primeiros contornos. Em dezembro de 1974, a URSS lançava a missão Soyuz 16, para teste do esquema de acoplamento e para ganho de experiência das duas equipes no trabalho conjunto. As equipes de ambos os países ajustavam os ponteiros, estudavam, testavam e construíam juntas, num raro momento de cooperação entre soviéticos e americanos.

Mas conta-se, sendo verdade ou não, que a questão do acoplamento quase miou com a missão. Isto porque nenhum dos dois queria ser a fêmea da missão. A criação de um dispositivo de acoplamento hermafrodita foi a saída para evitar, até mesmo, uma crise diplomática, que aquela altura seria desastrosa para a missão.

Menos de um ano depois, as duas superpotências estavam prontas para o lançamento. programado para o dia 15 de julho de 1975, tanto no Cabo Canaveral quanto em Baikonur. O encontro ocorreu dois dias depois, com a acoplagem muito bem sucedida e celebrada dos dois lados. Na pilotagem da Soyuz estavam o comandante da missão,  Aleksei Lenov, experiente cosmonauta já vindo de algumas missões e o primeiro a caminhar pelo espaço na história – e o engenheiro de voo Valeri Kubasov. No lado da Apollo estavam o comandante Tom Stafford, junto dos astronautas Donald (Deke) Slayton e Vance Brand.

Juntos, em solo, os astronautas Tom Stafford, Donald (Deke) Slayton e Vance Brand, juntos dos cosmonautas Aleksei Lenov e Valeri Kubasov. Os protagonistas da história no espaço entre os dois mundos. Abaixo, Deke Slayton encontra Lenov já em órbita (Reprodução)

Fora o primeiro objetivo – o da cooperação e teste para o caso de um acidente, o propósito da missão era simbólico. O encontro era referenciado como um aperto de mão no espaço, e literalmente o era. A barreira da língua e dos assuntos que não podiam ser ditos não foram obstáculos para ambas as tripulações, que brindaram, confraternizaram e até contaram piadas em pleno espaço. Um êxito mais do que festejado.

Mesmo que não soe tão emblemática para aqueles tempos, a Apollo-Soyuz não deixou de ter interpretações românticas sobre a relação entre americanos e soviéticos, especialmente naquele momento tão tenso da Guerra Fria. Depois de anos de corrida por armas e, claro, pelo espaço, as duas superpotências se encontravam no espaço, abrindo caminho para os futuros trabalhos conjuntos que viriam ao longo do tempo.

Uma destas interpretações veio na voz do inesquecível Hélio Ribeiro, em seu programa na Rádio Bandeirantes, como você ouve abaixo:

Simbolicamente, esta era a última missão da NASA utilizando-se do nome Apollo, já abandonado em 1972. O Soyuz ainda continua sendo utilizado pela Rússia nas missões lançadas de Baikonur, hoje no território do Cazaquistão independente e que é utilizado tanto pelos russos quanto por outros países. O trabalho em conjunto internacional no espaço continua cada vez mais forte graças a Estação Espacial Internacional, terminada em 2011 e hoje o epicentro dos trabalhos de vários países no cosmos.

E tudo isso começou com um primeiro passo entre duas superpotências, que deixaram por um dia, ao menos, se permitiram um momento de paz e calor humano mesmo no cume da tal Guerra Fria que acontecia no mundo abaixo deles.

Esta página da história é encerrada com este raríssimo documento produzido pela NASA em 1975, contando sobre a missão espacial que, apesar de esquecida, teve sua parte numa história contada nas estrelas:

https://www.youtube.com/watch?v=PlqT1Wq2H-4&t=29s

1 comentário em “Apollo-Soyuz: O encontro de dois mundos no espaço”

  1. André,
    Momento épico esta postagem sobre a conquista da Lua e a corrida espacial. Tudo seria melhor, menos custo se os dois países e até mais, se ajudassem e desenvolvesse essas naves e viagens em conjunto. Como foi importante essas viagens, dando melhor conhecimento sobre o Cosmos e no desenvolvimento humano. Mas além de muita gente não acreditar na alunissagem, desconhecem todo progresso tecnologico que nos proporcionou.
    Adalberto Day cientista social e pesquisador da história

Deixe uma resposta