
Ate parece um flash da infância, admito ao amigo leitor. Chega pelas beiras de junho e julho é como se o coração infante velho recordasse uma das festas mais animadas do colégio. O pitoresco cheirinho da pipoca e do quentão no ar (pinhão, este jornalista não aprecia, confesso), as animadas e inesquecíveis marchas e valsas do grande Mário Zan e de outros intérpretes, a fogueira estalando e esquentando o ar, as bandeirinhas tremulando no vento do vai-e-vem da gentarada miúda e graúda que peleia e festeja, o cavalheiro que é flechado pela graciosa dama de vestido rodado e olhar doce como canjica…
Ah, amigos, é nostalgia pura misturada a realidade, embora um tanto distorcida. É tempo de São João! Uma das manifestações populares mais coloridas e belas repletas de história, de encantos e lembranças. Da quadrilha marcada no salão, os rodeios do pau-de-fita, o baile rolando solto nas escolas ou noite adentro em todo o canto. Uma festa que não escolhe canto do país específico, acontece em todo o lugar, independente de ser alemão, italiano, português, o que for.
As origens e as cores

O São João que conhecemos tem origem distante, vieram de adaptações católicas das festas pagãs realizadas em celebração do solstício de verão, algo como adequar uma festa pagã a religião e a cultura de um país, a exceção da data que casa certinho com o 24 de junho, tradicionalmente o dia de São João. Neste caso, João Batista, aquele que Jesus referia-se como o maior dos filhos nascidos de mulher, preparador dos caminhos do Senhor e decapitado por ordem de Herodes para satisfazer os desejos da filha de Herodiades, mulher do nefasto imperador que, as escondidas, ouvia João e executou o pedido duramente.
De volta ao chão, o Brasil recebeu esta manifestação cultural advinda dos portugueses, que celebravam os santos populares nesta festa. Vale lembrar que junho, segundo o calendário, é mês de festa de mais dois santos: Além de João Batista, celebram-se no dia 13 Santo Antônio (o santo casamenteiro, na cultura popular), e São Pedro no dia 29. Mas, distante das nobrezas da corte e dos coronéis, as festas juninas eram a alegria dos sertanejos, dos mais abonados aos mais pobres, que vinham com as melhores vestimentas para curtir a boa e velha quermesse, regada ao som da sanfona, da zabumba e do triangulo no passar dos tempos.
O tempo passou, e o São João não escolhe povo ou cultura para se instalar. Não é exagero dizer que é a festa que mais reúne brasileiros, e mais até do que o carnaval, restrito a locais com mais tradição carnavalesca. Do Oiapoque ao Chuí, ninguém escapa desta manifestação, mesmo que seja tão contra a estas coisas que você possa chamar de bregas, não há quem não aprecie uma mesa farta de quitutes ou uma boa copada de quentão, feito a moda de cada região.


Na escola – A doce lembrança da infância junina
De tão pura e colorida, a Festa Junina é quase ponto obrigatório em qualquer escola do país. Para muitos alunos, a celebração é esperada ávidamente sempre que se entra no meio do ano. É uma verdadeira zorra organizada, onde meninos e meninas esquecem o uniforme por um dia para trajarem as melhores e mais curiosas peças de roupa. O terno velho do pai, as meias coloridas estranhas da mãe, o chapéu de palha, a pintura nas bochechas, os bigodes feitos a lápis… Quem vê, pensa o que quiser, mas para as crianças neste dia, é uma espécie de entrada num outro mundo, onde fingir-se de adulto é mais do que natural.

Eu, como um agitador de primeira grandeza, costumava caprichar no traje. Depois de um tempo, abandonei o bigode de lápis e passei a ir como um típico latifundiário. Chapeu de camurça e terno de meu avô, um anel falso, sapatos para fazer pompa, gravata daquelas de cor escura e toda ornamentada e uma palha de vassoura na boca. Tempinho agradável que íamos com umas pilas no bolso, já que os quitutes não eram de graça. As meninas me entortavam o pescoço, confesso. Aquela saia rodada deixava nós, os ainda protótipos de marmanjos, meio tontos, o que era inevitável. Eram belas, admite-se.

Eu tinha, naqueles tempos, uma companhia de agitação junina inestimável na EEB Padre José Maurício: A querida Jussane Schmidt Neumann. Eu e Jussane não perdíamos uma chance de, no São João, armar alguma apresentação ou participar de alguma. Na falta de um empurrão de um professor, eramos nós dois que puxávamos a quadrilha. Chamávamos os conhecidos e fazíamos do palco da escola de campo de ensaios. Tudo tinha que sair sincronizado pra festa sair perfeita, e ela também não descuidava do figurino, seja de moça ou de… moço! É, no São João, há algumas loucuras entre trocas de figurino, personagem, por ai vai.
Chegava o dia e a aula nem parecia que existia na prática. Antes do sinal bater já pulávamos fora da sala e não aguentávamos a ansiedade para começar os festejos. Comida de monte, professores que, em vezes, entravam no clima e fantasiavam-se também, aqueles olhares apaixonados nas moças que cruzavam nosso caminho. Era um dia totalmente anormal dentro da normalidade escolar. Depois, a esperada quadrilha, juntamente com outras apresentações de demais séries, com canções que ficaram marcadas, como o Alegrando o São João de Cristina Collares, aqui abaixo reproduzida.
Bueno, mas o tempo passou. Eu, Jussane e os amigos daqueles tempos de quadrilha nos separamos pelas correrias da vida, mas sempre recordamos sorrindo do tempo colorido, especialmente das Festas Juninas dançadas e fantasiadas ano a ano. Tempo inocente se compararmos com hoje, onde parece que o tal sertanejo universitário e a distorção de valores fizeram o São João ser mais uma balada qualquer em muitos casos. Maldita distorção!
Não importa, o que preciso nestas horas de lembrança é de um bom Mário Zan floreando seu inigualável Todeschini para fazer a lembrança bater. Histórias destes tempos tenho aos montes e conta-las todas ia tomar muito do tempo do amigo leitor. O São João bate ponto este ano outra vez para enfeitar a mente de todos. As bandeiras sempre tremulam, o sonho sempre continua, a vida segue e a fogueira queima… Quem sabe um dia, regressar a uma quadrilha para matar a saudade de uma infância saudosa, ávida das cores e embalos da Festa Junina.
Viva São João! Ontem, hoje e sempre!
André,
Recordar é viver nossas Festas pelo bairro:
As festas juninas em toda a cidade sempre foram fascinantes. Em minha infância e a de muita gente, lá pelos anos 50, 60 e 70, foram inesquecíveis. As escolas e igrejas promoviam grandes e belas festas. No dia 24 de junho os alunos iam para as aulas a caráter (caipiras) e havia as apresentações de quadrilha.
A Empresa Garcia também promovia magníficas festas juninas, organizadas pelos próprios funcionários da empresa. Minhas recordações são as mais diversas: uma enorme fogueira, foguetórios, pipocas, corujas (roscas de polvilho), maçã do amor, pinhão, quentão, cachorros quente, o tradicional churrasco, brincadeiras, pescarias, roda da fortuna, as famosas e esperadas quadrilhas, parque de diversão, e tantas outras atrações. Era emocionante.
As festividades eram realizadas no estádio do Amazonas, com teatros e desfiles pelas ruas da Glória e Amazonas, festas representativas de índios, sorteios de eletrodomésticos e outras premiações, culminando com um jogo do time anilado ou alvi-celeste, o Grande Amazonas Esporte Clube.
Sempre à frente destes trabalhos, lá estava o Sr. José Pêra (ou Zé Pêra) que era o motorista dos diretores e treinador do Amazonas. A supervisão da festa ficava a cargo do gerente de relações industriais, Nelson Salles de Oliveira.
Não há quem não tenha participado ou ouvido falar destas comemorações que emocionavam todo o Garcia. Tenho a convicção que como participante e atuante dessas festividades, elas são um cantinho da saudade que nos parece cada vez mais forte e evidente em nossa memória.
Adalberto Day cientista social e pesquisador em Blumenau