Seus pais, tios ou avós já devem ter aparecido em casa com um destes depois de uma visitinha a farmácia do bairro. Pequeno, recheado de curiosidades, piadas, advinhas, dicas caseiras, calendário lunar e previsões astrais, sempre com uma bela mulher ou uma paisagem de capa. Hoje, naturalmente, é algo mais cult, mas em tempos mais remotos, era um baita informativo para o ano todo.
Tradicionais e nostálgicos, os almanaques farmacêuticos passaram de antiquadas publicações ao status de relíquias altamente valiosas e colecionáveis, uma verdadeira mina de história e costumes resumida em algumas poucas páginas. Parado em casa na manhã desta terça-feira passada, percebi na mesa da cozinha um pedaço dessa história que nunca morre. Era uma antiga edição do veterano Almanaque Renascim-Sadol, publicado anualmente pelo Laboratório Catarinense desde a fundação da empresa, em 1945, na sempre bela cidade dos príncipes, Joinville.
O Renascim é só uma pequena parte de uma história longa destas publicações que atravessam décadas e nunca deixam de estar nas farmácias brasileiras. Há quem não as encontre mais pelas drogarias de confiança, mas alguns afortunados como eu e outros tantos ainda desviam os olhos e garantem sabiamente um exemplar, distribuído gratuitamente.
O pioneiro foi o Pharol da Medicina, publicação elaborada com o patrocínio da Drogaria Granado, do Rio de Janeiro (sempre o Rio), em 1887. A partir dele, as publicações que se seguiram copiavam os moldes do pioneiro. O Almanaque trata-se de uma publicação anual que traz dicas para o lar, datas boas para pesca e agricultura, horoscopo, curiosidades, anedotas, adivinhações, tudo para cada mês do ano. Era um verdadeiro guia de bolso, da mãe em dúvida ao aluno curioso, do agricultor ao pescador.
É dito que o mais conhecido do país foi o Almanaque Fontoura, criado pelo farmacêutico Cândido Fontoura, o criador do famoso fortificante Biotônico Fontoura. O que o faz tão conhecido e lembrado pela história é pelo fato de a ideia geral do anuário partir de um dos maiores gênios da literatura nacional: Monteiro Lobato. Amigo de Fontoura – e a qual devia uma por ter-lhe curado da fraqueza com o fortificante – era Lobato quem ilustrava e editava o Almanaque nos primeiros idos, dando-lhe personalidade e qualidade sem igual. A publicação esteve presente nas farmácias nacionais de 1920 até meados da década de 90, chegando a ter tiragem de 100 milhões de exemplares anuais em um período (tiragem de 1982).
Esta e outras tantas publicações, com o passar dos tempos, deixaram de ser simples peças antiquadas de um passado distante e passaram a ser exemplares ricos em história e simbolismo. Alguns exemplares, que no tempo de glória eram distribuídos de graça, são disputados atualmente a preços de ouro por colecionadores e sebos, por valores que variam entre R$ 15 a R$ 100, dependendo do valor histórico e se é um pacote com determinado número de almanaques.
Apesar do desaparecimento do Almanaque Fontoura, outros persistiram e seguem na trilha até os dias atuais, como é o caso do Renascim. Destaco especialmente nesta edição uma preciosidade que tenho ainda hoje guardada, até como recordação de meu saudoso avô, Godofredo Heiden. É um pequeno exemplar do Renascim de 1979, que além do conteúdo padrão de todo Almanaque, traz uma curiosa história em quadrinhos em que um barbeiro contador de histórias (Zé Navalha) e o filho curioso (Brasílio) viajam o Brasil atrás de histórias e pontos turísticos conhecidos.
O andamento do conto é meio forçado em alguns momentos, especialmente na hora de inserir propaganda (vale lembrar, o Renascim é um informativo publicitário do Laboratório Catarinense), mas é uma curiosa peça de fim de anos 70 que vale a pena ser lida e contemplada, especialmente pela capa que traz os vários tipos brasileiros em confraternização. Dentro, além dos quadrinhos e dicas, um desfile de marcas tradicionais do Laboratório, algumas até hoje na ativa, como Balsamo Branco (Boettger), o próprio Renascim, Melagrião, Sadol, Alicura, Figatil, Camomila Rauliveira (Camomila Catarinense), Água Inglesa, Catuama e outros tantos.
Veja algumas páginas do Renascim de 1979 (desculpem os rabiscos, coisa de meu tempo de guri pequeno):
Ah! Vale dizer que cada almanaque vem com a inscrição da farmácia (ou, naquele tempo, ponto de venda de medicamento, que podia ser uma pequena vendinha) que o cedeu. Neste de 1979, a recordação da antiga casa comercial de Max Klabunde, à época localizado no nº1940 da Rua Progresso, próximo a EEB Padre José Maurício.
Portanto, se você é um afortunado cujos parentes guardavam os Renascim a cada ano, guarde-os com carinho. Nunca se sabe quando você, no futuro, terá uma peça história de valor inestimável e que pode até lhe valer alguns bons trocados.
André!
Show de bola essa postagem sobre o Almanaque Renascim.
Só uma ressalva amigo. Se você possui alguns exemplares, jamais venda meu caro, deixa de ser “zolhudo” por dinheiro, isso é coisa antiquário, você é pesquisador e lembra que vai montar um museu.
Estou também colocando essa matéria em meu Blog, pois fala do teu avô e do Mercado do Max Klabunde. Alias procure escrever sobre este antigo Mercado é importante, consulte o Beto Klabunde.
Adalberto Day cientista social e pesquisador da história em Blumenau.
Usei o Almanaque Renascim como uma das tantas outras fontes necessárias para escrever meu livro Verde Vale, que se encaminha para a 14ª edição. Consultava nela as épocas de semeaduras e plantios da lavoura.
Como viver sem um almanaque Renascim?
Abraço,
Urda Alice Klueger
Desde criança aprecio os almanaques de farmácia e eles evoluíram com o tempo me acompanhando durante meus 63 anos Seria uma pena não continuar sendo distribuídos. São importantíssimos para nossas famílias desde os suplementos e plantio até às páginas de lazer. Parabéns aos idealizadores. Um grande abraço.
Roseara Maxwell
Bom dia.
Vendo estas publicações, voltam as grandes e boas lembranças do tempo de infância. Aprendi muito graças aos almanaques. Ficava ansioso quando não encontrava as respostas de algumas curiosidades, pois ficavam nas últimas páginas e um pouco ” escondidas”. Tenho algumas publicações adquiridas em farmácias, a mais antiga é de 1971;
ainda estão bem conservadas, pois são guardadas com muito carinho.
Voltei aos meus dias de infância. Eu e meu irmão líamos esse periódicos. Inclusive o da Bristol e o famoso “Almanaque do Pensamento”. Excelentíssima, essa matéria. Parabéns pelo compartilhamento.