A marcha dos ônibus (Parte 1: Os primórdios, a integração, os personagens e os problemas)

Lotação, atrasos, faltas de linhas, faltas de ônibus, frota antiga, confusões…Quem hoje faz no dia a dia o transporte coletivo como o meio vital de deslocamento a todo canto de Blumenau mal pode pensar que, por trás do tanto que ainda precisa ser feito, outro tanto já foi feito.

No mês de maio deste ano a cidade-jardim não lembrou como se esperava, mas completaram exatamente 20 anos do sistema integrado de transporte coletivo no município. Um plano feito aos trancos e barrancos, e que mesmo no século XXI ainda precisa ser muito aperfeiçoado, mesmo a custa da incompreensão de quem é o responsável por esta ciranda.

Olhando a história, parece até que Blumenau tem um caso sério com a, hoje chamada, busologia. Não é a toa, já que foi no município que surgiu a empresa de ônibus mais antiga do país, a Auto Viação Catarinense, em 1928, fazendo a linha Blumenau-Florianópolis. Até os dias atuais, a Catarinense é sinônimo de presteza e confiança em quem conta com os serviços de transporte pelo estado e por vários rincões do centro-sul brasileiro. No entanto, a mesma presteza e confiança custa a pegar onde o coletivo é mais necessário: Dentro de Blumenau.

A dificuldade de se locomover de ônibus em Blumenau…pontos cheios, linhas confusas, lotação…problemas a se resolver (Gilmar de Souza / Santa)

Pode parecer espantoso, mas até 1995 o sistema de transporte urbano funcionava da mesma forma, apenas mudando o local de entrada nos coletivos (da porta traseira para a dianteira). Pegar um ônibus lotado de casa até o centro, e vice-versa, era rotineiro e a demanda só aumentava, dado o crescimento cada vez mais constante da cidade. Sem contar que, sem integração, o Centro era o terminal de todos os usuários do transporte coletivo, que necessitavam pagar outra passagem para ir a outros bairros. A necessidade de se fazer algo já permeava a cabeça de visionários desde os anos 70, mas tomar uma atitude ainda estava distante.

Entre as responsáveis pelo conduzir do blumenauense dentro de casa, a Viação Nossa Senhora da Glória é a que tem até hoje o cartaz de “maior de todas”. Fundada em 1962, fruto do empreendedorismo da família Sackl, a Gloria detêm a maior frota e a maior porcentagem de linhas do atual sistema. Sem contar que é dela a maior linha de deslocamento de passageiros da cidade: o sempre folclórico Troncal 10, o Garcia-Aterro via Rua São Paulo, cujo costumo me referir como a sala de estar do blumenauense.

Depois dos tempos dos “monobloco” Mercedes-Benz, um dos coletivos da Glória no tempo pré-integrado. Para quem nunca viu, repare a entrada e saída invertidas (ValeBUS / Gloria)

Logo atrás, está a Coletivo Rodovel, que só adotou o atual nome em 1978, 20 anos depois da fundação, em 1958, ainda como Transporte Coletivo Fiedler LTDA e depois de se chamar Coletivo Ouro e Prata. Olhando de fora, a empresa é o retrato da Velha, e não é mentira já que é la o reduto da empresa. Tem uma das frotas mais bem cuidadas da cidade, sempre com ônibus impecavelmente conservados e modelos atualizados. Ir para a Velha é quase sinônimo de seguir viagem com um dos veículos da Rodovel.

Depois de se chamar “Transporte Coletivo Fiedler” e “Ouro e Prata”, a Rodovel assumia o atual nome em 1978″ (Railbus)

A terceira filha do transporte coletivo blumenauense tem raiz gasparense. Fundada em 1975 pelos irmãos Jair e Tibúrcio (In memoriam) Bogo, a Viação Verde-Valeentrou para a roda em 1989, quando foi lhe dada a concessão do transporte coletivo, especialmente para a região da Itoupava Central e Vila Itoupava, onde se localiza a garagem da filial blumenauense. Tem uma frota que, muitas vezes, está a frente do que costumeiramente se vê de ônibus na cidade. Já teve até coletivo com ar condicionado (sonho de verão) e hoje anda com certa ostentação com os dois únicos BRT (Bus Rapid Transit) da cidade.

Tibúrcio e Jair Bogo diante de alguns dos carros da frota. Além do intermunicipal (marfim e verde) os coletivos blumenauenses (Verde Vale / ValeBUS)

A plena, as três empresas estavam envolvidas nos estudos que começaram em 1989 para a implantação de um sistema no mesmo modelo do utilizado em Curitiba. O objetivo mais claro, além de reduzir o número de ônibus no centro, era de proporcionar o pagamento de uma passagem. Naquele ano mesmo já começavam as trocas de veículos das frotas, de ônibus de duas portas, antigos e com chassi de caminhão, por ônibus chamados padron, com três portas e chassi especialmente criado para ônibus.

A nova configuração para o transporte integrado. ônibus padron de três portas, com faixas coloridas para cada função. Na foto, um Troncal (Gloria / ValeBUS)

Enquanto as empresas faziam a parte delas na troca de coletivos, eis que começava-se, em 1991, as obras dos terminais Fonte e Garcia, prontos em 1992 e 1993, respectivamente. Ao mesmo passo que se conduziam as obras do Terminal do Aterro, até hoje o maior do sistema, concluídas em 1995. Construções que exigiam uma certa ginastica que não se vê nos tempos modernos. Na Garcia, o ribeirão do bairro Gloria foi todo canalizado para a construção do terminal. No Aterro, o terreno teve de ser bem preparado, afinal o Aterro vem do fato de, no local do terminal, existir em tempos passados um aterro de lixo.

27 de abril de 1995: Jornais já começavam a preparar quem iria enfrentar o turbilhão do dia seguinte (Santa)

Terminais apostos, ônibus devidamente identificados com as novas funções, é hora de colocar o velho sonho em funcionamento. Era o dia 28 de abril de 1995, e o que se via nos terminais era quase uma cena apocalíptica. Lembro bem, era uma criança de quatro aninhos junto da mãe quando, confusos, não sabíamos para onde ir. Apesar do despreparo, as coisas iam funcionando. Lentamente mas funcionando. O que para nós hoje é tão simples, pular de um ônibus para outro no terminal ainda trazia confusão. E mais, nem todas as localidades de Blumenau eram contempladas, e muitos ainda pagavam mais de uma passagem.

As primeira linhas do transporte integrado. Algumas saindo bem distantes dos bairros de origem, como as rumando a Fortaleza, que saíam do Aterro e da Fonte (Santa)

No ano seguinte, era terminado o quarto terminal do sistema, o da Velha, que selava a primeira fase da implantação do tão sonhado transporte (ainda mal) integrado. Mas, quem pensa que o pau torto não podia (levemente) desentortar, surpresas virão adiante. Eis que um um novo prefeito chegava, e tornaria o transporte coletivo uma espécie de bandeira.

Mas isto já é uma outra história…

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