Catedral: Seis décadas (de tantas mais) no coração da XV

No alto da colina, entre as Ruas XV, Padre Jacobs e 7 de Setembro, uma imponente casa religiosa é a testemunha viva de várias mudanças no centro blumenauense ao longo dos anos. Mais precisamente,
seis décadas assistindo o dia-a-dia da cidade-jardim, sempre com sua elegância e modernismo fruto de um trabalho de pai e filho. São os 60 anos da atual Catedral de São Paulo Apóstolo, celebrados com alegria e recordação de tempos de persistência e revolução (Jaime Batista)

Sua imponência é inegável, foi feita para representar a posição de liderança que exerce, especialmente hoje, como principal templo católico da cidade. Está na mesma colina histórica que, há mais de 150 anos, fora erguida a primeira capela pelos primeiros alemães católicos incentivados pelo Pe. Alberto Gattone, sacerdote gasparense que atuava na cidade. E, tão além de templo, é o mais marcante dos cartões postais da cidade, uma velha observadora do centro blumenauense que usa a mesma roupa moderna desde 1958.

No último dia 25, com celebração solene e grande festa, as principais autoridades católicas de Blumenau recordaram os 60 anos da nova Catedral de São Paulo Apóstolo. Diz-se nova para não confundir-se com a história completa da comunidade que existe desde 1854, apenas quatro anos após a fundação da colônia e que, em 1958, concluía a construção da nova igreja, uma espécie de cenáculo moderno de arquitetura única em todo o país.

Também por dentro, as notas de um templo moderno, fruto do idealismo de dois alemães que já deixavam sua marca em outras construções pelo mundo; Dominkus e Gottfried Boehm, conhecidos por construções imponentes que não esqueciam as ligações com o passado (Reprodução)

Uma história que começou na prancheta dos arquitetos alemães Dominikus e Gottfried Boehm, pai e filho responsáveis por construções modernas que criavam links com o passado, representavam imponência e marcavam uma revisão do estilo gótico alemão, segundo os especialistas em arquitetura. Marcas destas construções estão espalhadas pela Alemanha, em vários pontos do mundo e até na vizinha Brusque, cuja Paróquia de São Luiz Gonzaga levaria os mesmos traços característicos dos criadores.

Em Blumenau, o antigo templo datava de 1876, projeto de Henrich Krohberger ainda dos primórdios da comunidade surgida 12 anos antes pela iniciativa do Pe. Gattone, incentivador da construção da primeira capela. No entanto, o passar do tempo revelou o desgaste da antiga estrutura, já desfigurada desde os anos 1920 depois da ampliação do templo e a colocação de mais três sinos na torre. A ideia de uma nova igreja ventilava os ouvidos dos sacerdotes e colaboradores e se tornaria realidade em  24 de maio de 1953, quando a pedra fundamental da nova Igreja-Matriz seria lançada, posteriormente abençoada e com a demolição do velho templo autorizada, em 1956.


Apesar do contra-gosto de muitos, contrários a demolição da velha igreja, as obras da nova igreja eram, aos poucos, notadas por quem passava pelo entorno da XV, Rua Padre Jacobs e Rua 7 de Setembro, sobretudo pela imponência que mostravam e suas linhas diferentes. Eram as marcas da arquitetura dos Boehm que davam ao futuro novo templo um ar moderno jamais visto entre as várias igrejas existentes na região.

Logo, as paredes subiam, cercando a nave central, suas colunas e o mármore acinzentado com 3 mil pedras de granito vermelho, vindas de trem da localidade de Subida (Apiúna). Além dos grandes vitrais simbolizando três elementos do novo testamento: o pão, o vinho e os peixes, o que também da ao mais incauto a primeira impressão de estar no fundo do mar. Era grande em todos os sentidos, desde a audácia do projeto ao seu tamanho: 15 metros de altura, 23 metros de largura e 75 metros de comprimento. A unica recordação da antiga igreja era a ponta da antiga torre, colocada no telhado na ponta voltada para a Rua 7, onde está até hoje.


Foram cinco anos contínuos de obras até 25 de janeiro de 1958, quando finalmente o novo templo era entregue, sob a consagração do então cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, o catarinense Dom Jaime Câmara. A nova estrutura despertava o fascínio dos visitantes, acostumados com modelos clássicos nas comunidades dos bairros e que observavam atônitos o gigantismo de linhas e a imponência da nave na primeira missa, celebrada pelo então bispo de Joinville e responsável da comarca, o saudoso Dom Gregório Warmeling.

Cinco anos depois, o elemento faltante tomava corpo acima dos 46 degraus da escadaria na Rua XV. A Catedral estava completa com o nascimento da torre, um verdadeiro ícone de Blumenau erguido a 45 metros acima do solo ostentando no seu topo os três sinos, agora em um lugar correto bem diferente da torre adaptada na década de 1920.

Fundidos em aço em importados de Bochum, na Alemanha, pesam respectivamente 510 Kg (Jesus Cristo), 350 Kg (Maria) e 200 Kg (José) e seriam acionados por um possante motor elétrico que também regulava os relógios nas faces do topo. Originalmente, o projeto inicial previa cinco sinos, mas acabaram ficando apenas os três originais, que badalavam abaixo da pequena cruz de granito vermelho de 1,2 mil quilos no topo da torre.


Desde então, são seis décadas como uma testemunha velada dos acontecimentos que marcaram a história de Blumenau ao longo de todo este tempo, como uma silenciosa presença que, muito mais do que encantar turistas e moradores (católicos ou não), foi pano de fundo de alguns dos acontecimentos mais importantes da cidade.

Muito além das celebrações ecumênicas e seus três bispos a frente da diocese desde 2000, a catedral e sua torre viram na sua rotina os grandes desfiles cívicos, as enchentes que bateram em suas escadas, as grandes greves de 1989, as celebrações de rua da Oktoberfest que por vezes lhe tiravam a paz, a descida do presidente Helmuth Kohl em 1991 e de jipes nos vários eventos do Jeep Clube. Anos dourados e difíceis, sempre apegada em sua função de levar a mensagem de fé e paz, mas também uma presença constante na história blumenauense.

Por dentro das paredes granitadas, grande e inesquecíveis celebrações foram a sua grande marca dentro do mundo católico. Desde a sua benção aos seus vários párocos que por lá passaram. Casamentos, primeiras comunhões, a instalação da Diocese e o grande momento: a reunião máxima de católicos e luteranos no mesmo teto, na mesma celebração, numa prova de paz e irmandade entre as duas igrejas.


Mesmo tão jovem em comparação com seu antecessor, o templo atual guarda diante de si marcas tão importantes quanto. Seis décadas como um observador silencioso, imponente, pacífico, tudo isto diante de um centro tão movimentado e inquieto que, parece disfarçar, mas não deixa de olhar de lado para suas paredes e memórias de seis décadas.

 

 

(Reprodução)

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