Desacelerar, o mundo e o carro

“Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma…”

“Paciência” é uma canção do gigante Lenine lançada em 1999 e que, admito, não curto tanto. Mas talvez as frases que rolam dentro dela, num ritmo lento e comedido, façam mais sentido se refletidas nestes primeiros dias do ano, em que a velha pergunta sempre vem: por que tudo passa tão rápido?

É claro que, por ai, tem quem queira colocar a responsabilidade na rotina, baseando-se em mil palavras de especialistas do tempo. Mas na verdade, a impaciência nossa não nos faz perceber a própria pressa que desenvolvemos, querendo ir mais rápido, navegar virtualmente mais depressa, fazer com que uma sexta-feira chegue o mais veloz possível para um fugaz fim de semana.

Estes dias, como mais um pingo da imprudência no trânsito, presenciei um duplo atropelamento perto da rádio em que trabalho. Duas garotas, machucados, sangue na pista e aflição. E dentro do veículo/arma envolvido, a motorista em choque ou com medo das reações talvez se remoía por dentro presa na pressa que ela mesma se colocou.

Corremos demais, vivemos cada vez mais sem planejar ou usar o tempo a nosso favor e não a ser escravo dele. E por correr demais, o inesperado e trágico nos espreita fazendo-nos parar bruscamente. O trânsito, estas veias que circulam o ritmo das cidades com carros e motos refletindo nosso individualismo, é a prova cabal: somos impacientes, individualistas, insensíveis e hipócritas quando pregamos o contrário em troca de visibilidade social.

O frear de um ritmo começa em vários aspectos, como olhar em volta e ver o relógio de vida trabalhar sozinho, ou simplesmente tirando o pé do acelerador e brecando o próprio ritmo no uso da arma que você está dirigindo (sim, o carro é uma arma, pela definição dos parâmetros de autoescola). O tempo mal-usado e ignorantemente apressado enfraquece, esvazia e, por que não dizer… mata.

Tire o pé do acelerador – do carro e da vida – e tenha prudência. Mesmo que pedir isto seja inútil, aguardando o próximo acidente pela pressa individual, tire o pé e deixe a vida correr com seus planos e surpresas boas. Às vezes, o olhar em volta e a leveza pedem o que Lenine pedia: “um pouco mais de calma”

E temos esta calma? Sobretudo você, motorista?

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