Do dia que comecei na RICTV

A gente sempre lembra de onde partiu caminhando…

Quem nunca olhou para trás e viu o tanto que andou antes de voltar o olhar para frente e perceber o tanto que tem pra andar com a mesma ansiedade de quem está começando?

Nestes dias de março, enquanto balanço minha cadeira de um lado para o outro nos corredores da União, ainda pareço sentir o mesmo frio na barriga e timidez daquele guri de 22 anos no primeiro dia dentro daquele caldeirão que era a tão falada RICTV Record, com a benção de Alexandre Gonçalves para adentrar naquela caixinha de tijolos na Rua das Missões.

Tão inocente, tão ingênuo, tão infantil e virgem para o mundo a sua volta. As vezes me dá raiva só de pensar no moleque que era. Parecia mais um adolescente recém-saído da escola do que um acadêmico querendo descobrir como se faziam as coisas da profissão que escolhera militar mesmo a revelia do mundo dinheirista que vivemos.

Aquilo era o resultado da minha teimosia em trabalhar com comunicação? Nem queria saber, estava ansioso, curioso e razoavelmente medroso para conhecer aquele lugar. Eu sabia que era tudo por mim agora. Desde que tomei a atitude de encarar meu primo e pedir demissão da fábrica de cuecas em que trabalhava por cinco anos, respirei fundo e não ouvi os desesperos maternos: eu precisava começar.

Eu, a Thami e o Alexandre José

Thamiris Beling, na época acho que estava com 22 anos, era a “pequena-notável” da casa. Olhando para trás, hoje, eu costumo pensar que é a profissional de marketing que queria ter na rádio hoje em dia. Naquele tempo, tão cru que era, talvez a enxergasse erroneamente como uma espécie de “chefe rígida e exigente”. Longe disso! Eu era o estagiário, o escalão que aprende, pede orientação, escuta mais do que retruca, pergunta mais do que faz e, parecendo ou não, assimilava.

Talvez hoje entenda bem mais a preocupação dela, sobretudo de tentar compreender por algum ângulo lógico quem era aquele bendito garoto com cara de caipira do Reino, de camisa listrada, portando uma bolsa do encontro de expedicionários e que mal dava “bom dia” para todos dada a sua encarnada timidez juvenil. Ah, tomara que a Thami entenda…

Então, quando passava a porta que separava o mundo da redação: o formigueiro. Todos corriam, falavam ao telefone, engoliam cafés ou cuias de bom chimarrão e alternavam-se entre o nervosismo febril e a calmaria brincalhona com o novato. Observava a todos e tudo a todo momento e no mesmo lugar com aquela perdida sensação de criança no shopping: por onde começo? Quem são vocês?

Um recorte de um dia naquela redação da RICTV. Eu tô lá atrás, junto do galo Pereira

Gozado perguntar isso diante de faces conhecidas do dia-a-dia na TV. Até mesmo o inoxidável Alexandre José, amigo da primeira hora naqueles corres diários e figura pública das mais identificáveis no meio, tornou-se, para mim mais um de tantos naquele estranho balé. Logo, alguém me interpelava com os destaques do dia: isso, aquilo, aquele outro, o que que dava release e o que ia para Facebook e Twitter (Instagram ainda era mato naqueles idos).

Se eu contar que, sendo estagiário da assessoria de imprensa não tinha tido uma única aula desta pasta com a Cris Soethe naquela altura da faculdade, talvez ninguém acredite. Criar um texto com a estrutura que conhecemos era um desafio pesado demais para uma cabeça tão confusa de tudo. A a primeira revisão da Thami me tranquilizou, embora sabia que a régua da dificuldade ia aumentar no correr dos dias.

E esse correr de dias, por princípio, me amedrontou mesmo, confesso. Na sinceridade, tinha a sensação crua de ser o “pária” da turma, mas tinha que respirar fundo, não deixar a solidão me verter lágrimas e mostrar meu cartão de visitas. Logo, quase que como um resgate na confusão, comecei a tirar a carapuça de “rabugento” e o simpático “bom dia” começou a sair de minha boca mais facilmente. A coisa parecia estar fluindo.

Para aquela casa, o André virou o “Portuga”, culpa do mesmo Alexandre José, que percebeu a mania boba de talhador, andando pela casa com a caneta em meu ouvido. O fervo das coisas misturava-se ao rodar do teleprompter, passo sincronizado com os olhos do galo dentro do estúdio, sem perder o ritmo da coisa e não me distraindo nem mesmo com o envolvente refrão de “Sweet Home Alabama” que saía do celular do Deluca, ao meu lado cortando as imagens.

E quando tudo isso acabava, era pegar a mochilinha e sair. As vezes com o semblante de que o dia “não foi tão bom” ou que “tudo tinha dado certo”, do release ao jornal, do “bom dia” a relação com todos. Eu me enxergava nos vidros do busão quase como uma criança descobrindo o mundo mesmo com seus 22 anos estampando a face.

Quem eu era? Quem era aquele acadêmico de terceiro semestre – sendo o primeiro de jornalismo – diante daquele mundo de gente que também queria seu lugar ao sol?

Hoje, mais sábio, ainda aprendendo muito e bem mais crítico para certas coisas, me reavalio todo tempo, revejo meu ser e sou tão mais eu do que era naqueles tempos de autoafirmação. Desperdicei chances, enervei colegas, deslizei. Era a época de errar? Notadamente!

Mas aprendi algo, tive o primeiro choque de como era mesmo este maravilhoso, agressivo e, por vezes, cruel mundo da comunicação. No começo, pensei ser o mais complicado de todos, e era porque tudo era muito inicial, não sabia do rumo certo que queria tomar mesmo sabendo que era o rádio a paixão primeira.


Uma década depois daquilo tudo, sem arrependimentos (até mesmo do que possa ter perdido ou deixado de fazer), eu somente agradeço a cada cabeça santa que encontrei por lá. Queria nomear todos, contar todas as histórias, certamente cada uma merecia uma linha bem escrita. Mas isto é uma crônica, não um livro autobiográfico, e é melhor assim antes que esqueça de mencionar alguém.

Aqueles corredores daquela caixinha tijolada da Rua das Missões mexeram comigo. De boas a “nem-tão-boas” lembranças, muito de mim neste correr do jornalismo vem comigo até hoje. Os colegas de corredor viraram companheiros de imprensa. E como é bom e gratificante encontra-los nessa altura da caminhada com muito mais sabedoria e madureza do que aqueles tempos! Coitado, infelizmente, é de quem ainda vê o “Portuga” como o mesmo infante perdido no meio da redação.

Enfim, já escrevi demais. Daquele tempo, resta a gratidão por tudo e por tantos que, da sua maneira, mostraram como as coisas eram. Que estejam todos bem e firmes no que fazem.

São só 10 anos de imprensa, de corre, de comunicar, de falar. Só quero seguir adiante nisso, por favor!

Até mais ver!

Deixe uma resposta