Tears In Heaven

Março de 1991: A vida, como a constante de seus acontecimentos desde o início de sua trajetória, lhe deu tudo: fama, reconhecimento, admiradores, aventuras, até mesmo o dinheiro, luxo e excessos que advém de algumas destas personas do show business.

Indiferente a correria de compositor do pai, uma criança corria frenética e divertidamente num apartamento no 53° andar de um condomínio em Manhattan, a bela ilha da “Big Apple”, em seu esplendor daquele dia.

Pimpão, alegre, imaginativo, o garoto vivia seu mundo e o seu pai, o dele, pensando fixamente no pequeno sonhador que estava naquele lugar. “Que sonhos? Que caminhos? Que rumos que ele tomaria quando, talvez, chegasse na minha idade?” Pensasse, hipoteticamente, aquele cidadão barbudo armado com uma guitarra preta.

Distraído, inocente, imaginativo, o pequenino não percebera uma janela aberta displicentemente num dos cômodos da casa. E foi ali que a criança mergulhou, voou em um mar de cummulus nimbus para algum lugar e nunca mais voltou. Tinha apenas 4 joviais e simples anos de uma vida tão curta.

O pai desaba, desaparece do mundo para se curar, longe dali. Da dor que ainda estava cicatrizando sem o pequenino ao seu lado, faz brotar uma das canções mais belas que a parada internacional poderia ter recebido. Foi tema de filme, ganhou prêmios, reconhecimento, versões e marcou vidas, mas não trouxe-lhe de volta o filho, em algum lugar do dito paraíso.

“Tears In Heaven”, tema do gigante (e controverso) Eric Clapton, nasceu da dor maior do célebre guitarrista. Ele a leva consigo até hoje como uma forma de recordar, segurar pela mão o pequeno Conor, a criança que está mergulhada no mar de nuvens o acompanhando de algum lugar em cada momento.

Talvez não soe de bom tom falar, mas como não sentir, assimilar o peso de um dia horrivelmente pesado pela barbárie e dor de quatro crianças partidas daqui sem a chance da defesa? Quatro famílias que, hoje, enquadraram-se, verso por verso, na criação de Clapton, sem saber se os pequeninos, como diz a música, “saberiam seu nome quando se encontrarem no paraíso”.

Há um peso no ar da sempre alegre capital da cerveja, e vai demorar alguns dias pra respirar um pouco mais leve nessas esquinas provincianas. Há quem diga que é “exagero meu”, mas experimente ser empático por um momento, colocar-se no lugar de quem, agora, chora copiosa e dolorosamente sem ter o filho e filha em casa, pimpão e inocente, correndo e brincando de futuro.

Realmente, Clapton soube traduzir a dor de um pai sem a mão do filho para lhe fazer sonhar colorido. E sei que cada pai, mãe e figura próxima destes tantos ceifados no cercado escolar devem encontrar alívio na oração e nesta letra tão direta e simples do velho cantor.

Há lágrimas no céu hoje, amanhã e depois e depois são outros dias. O peso passa, o buraco fica, a justiça se pede, a vida tem que ir seguindo. Vamos ouvir e meditar…

Há lágrimas no céu…

(Tradução livre de Hélio Ribeiro / Rádio Globo)

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