O que aconteceu com o Natal?

Já faz alguns dias que ouço essa pergunta me martelando. Pelas noites, voltando à casa, olhando em volta o mesmo escuro de todo dia, parece que se dá coro a quem me diz que nem parece estarmos no Natal outra vez.

Às vezes, fico receoso de escrever algo e cair no mesmo discurso simplista de todos que pensam a mesma coisa. E as respostas para esse preto-e-branco de dezembro estão escancaradas: na preguiça, na frieza do cotidiano, em quem observa tudo com aquela expressão de “até que enfim” que outro ano termina, bem ou mal.

Displicente, deixei-me levar pela poesia de Frank Sinatra e buscar alguma coisa que explique onde foi parar aquele espírito tão aconchegante de um fim de ciclo com o inocente brilho pueril das festas. Em algum lugar, e não falo do passado, ele ficou trancado, esquecido e sufocado por tantos “porquês” desta vida pesada e crua, vaidosa e mascarada pelo virtual.

Há quem diga não querer celebrar ou viver este espírito, pois as recordações dos que partiram e a sensação por vezes “brega” dos mesmos processos a deixam afastada ou enjoada de tudo em volta. Tem quem aponte o dedo para o mais óbvio para si: momento político, social, correria, brigas, ou simplesmente porque “é adulto”, não se deslumbra mais com a reluzencia das noites destes dias, mesmo algumas molhadas pela chuva.

E eu evito de perguntar, me resigno na minha ignorância apenas observando parcos enfeites em nosso meio e as reuniões entre amigos e famílias com sentimento de “compromisso de agenda”. Algo que começa e, rapidamente, acaba para dar lugar a próxima série do Netflix de cada dia.

Aonde nos deixamos resfriar-se neste período? Será que eu era inocente demais em tempos passados para perceber que é assim mesmo que o Natal é para o mundo? Aqui não destaco o elemento religioso, pois vai da fé de cada um, eu aponto para o sentimento da época, aquilo que, em algum momento, nos fez deslumbrar-se com a doce fantasia de algo mágico e diferente que nos cercava.

Em algum lugar, e não faz muito tempo, a maneira de vermos o Natal ficou ainda mais artificial, transformando sorrisos montados em motivadores de curtidas virtuais e nada mais. Viver a fantasia tornou-se algo piegas, frio, desnecessário, desimportante. É como se você, no afã de querer expressar sua leveza nesta época, fosse crucificado com olhares desaprovadores de quem há tempo perdeu este sentir.

São dias muito frios para se sentir, de fato, o verdadeiro sentimento de Natal: o que acolhe a todos de verdade, que esquenta corações em volta de uma mesa e que se deixa olhar o céu imaginando mesmo que há um senhor de roupa vermelha e longa barba levando presentes por ai. Nem isso uma criança se deixa imaginar, na desculpa fria do “prejudicial”.

Lamento não poder deixar uma mensagem de bom Natal de verdade a quem lê, mas se ainda há um pouco de fantasia em você, deixe-se levar e não se amarre no comodismo moderno. Uma lâmpada acesa, um enfeite, um pinheiro em pé ou um abraço mais talvez te façam redescobrir esta fantasia há tempos sumida de sua face.

É difícil pedir o contrário, por ser acusado de alienado ou infantil. Mas que seja, vou ver meu deslumbre ainda acreditando em dias melhores, distante de sentimentos falsos ou viveres artificiais. O Natal pede a fantasia de verdade, a mágica que nos faça pensar em algo melhor, inclusivo e verdadeiro.

Mas não… e eu pergunto: o que aconteceu com o Natal?

 

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