Depois do voo da borboleta

Você sente-se fraco ao falar do que já passou?

Talvez não guardaria nada, nem mesmo um tímido bilhete de canto de folha de outros tempos, apenas para se colocar numa posição de “forte” diante de um fim, uma despedida que você talvez não esperasse.

Eu ainda recordo da última vez que ela me ligou. Não foi um “boa noite”, embora a reação de minha parte foi mais adulta e protocolar do que sentimental. Choro, lamento, o ponto final antes de que algo pudesse ser feito e atestando o último suspiro de uma história.

Se teria futuro? Não sei e nunca saberei. Digo com certeza, estes tempos entre um ano e outro tem passado mais veloz que décadas. Não dá tempo de prospectar o que seria, nem se aquela noite fosse adiada para outro momento, ainda mais dolorido.

O tempo veio passando, e aquela carta – que me fora a última lembrança do toque e do jeito doce dela – ainda está comigo. Foi seu adeus mais profundo, e prefiro pensar assim do que acreditar, partindo da frieza humana, de que aquela carta foi “protocolar”, como se outros recebessem igual.

Da “moça do ônibus” não seria nada padrão. Eu sei o que ela sentia, e tarde percebo o que ela sentiu ao me observar ainda num processo meu sem a entender ou a entendendo em partes.

Dias de sol, chuva, vento, frio e calor. Dias bons, alegres e tristes, mais inspirados ou mais introspectivos. Tudo foi passando e o frio se instalou entre nós. O pedido do pai foi um vento e nem amizade me sobrou, e nem queria mais: não era mais a mesma.

Sentimental demais eu sou? Não sei, e me desculpe você que pense isso. O ser humano tem esse processo de querer congelar sentimentos e não deixar-se sentir o que é verdadeiro, agir leve e mais intensamente movido pela emoção de algo. Endurece, se fecha, se cala.

Senti o mesmo vindo dela nas últimas vezes que nos conversamos: Dura frieza e indiferença ao mais belo, ao que foi sentido no passado, como se este fosse fraqueza e desnecessário. Algo mais protocolar e cru do que suave e alegre. A gente sente, vindo o mais duro papo, que é hora de seguir as suas filosofias como sempre segui e abandonar aquela crisálida de gelo que a ela transformava-se.

Sentimentalismo nunca foi uma fraqueza, jamais! São poucos que movem corações e se deixam sentir coisas boas ao seu caminho, entrando de mansinho e inspirando versos atrás de versos, vivendo momentos intensamente, seja de prazer e carne ou de beleza e carinho, na maior amizade possível.

Hoje, não faço ideia por onde anda, como está e se já está morando sozinha. Lembro de como questionava minha falta de independência, mesmo eu tentando me entender no processo que estava. Não sou mais o mesmo André daquele setembro, e talvez esfriei para algumas coisas (inclusive do amor), mas se perdesse minha essência e coração, quem eu seria?

A gente precisa enxergar-se em um espelho e afirmar-se homem: definido, reto, probo e valente. Precisamos tomar as rédeas de nossa vida nem que seja nas paredes da casa de nossos pais, precisa mostrar-se altivo e firme nos rumos a seguir, mas no meu caso: sem jamais esquecer o coração, a poesia, a verdade dos sentimentos que o ser humano teima em esquecer na frieza da evolução em que se coloca.

Ela não me entendeu, não posso mudar o que ela pensa, nem mesmo obriga-la a sentir amor por mim. É um ser livre que desejo que continue voando, como a borboleta que sempre foi e que, num dia meio cinza, resolvi ver quem era quando pousou em meu caminho.

E não nego-me em falar deste passado: ela foi especial, me ensinou algo que não consigo traduzir em palavras, mas em ações como um homem pleno do meu processo e vontade de ser tão forte e livre quanto sensível ao verdadeiro amor e a beleza da vida em volta. Ela é linda, doce, determinada, inteligente, e em algum lugar ela soava poesia e me deu tudo isso.

Era ela a melhor conversa, a maior amizade do mundo (o que defino o amor), e as horas que conversávamos era como se compartilhássemos vida e experiências do mundo ao nosso redor. E, no fim antes do “boa noite”, um carinho simples, sensível, que faz parte do metier do amor.

Bem, já falei demais, guardei as lições e continuo as aprendendo até hoje, por mim e pelo que me virá segurar a mão no futuro. E não quero cair na lógica esdruxula do “não existirá outra como ela”, mas só ela me foi capaz de abrir estas lições, as vezes duras e muitas vezes, necessárias e firmes.

Eu não sei se ainda sou o homem que quero ser, mas só sei que ela tem parte nisso e sempre serei grato a ela. Não estranharia nossos caminhos se cruzarem um dia, e nem sei como seria e em que estágio seria, mas só queria, um dia, que esta borboleta pousasse por estas plagas as vezes frias.

Um borboleta como ela faz falta, e não me sinto fraco ao falar disso, da tão famigerada mania de “lembrar de uma ex”. Posso sentir falta dela?

Gratidão, borboleta…

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