Aquela prainha…

Você tem visto as ondas da Prainha?

Me diga se, esses correres diários de seus pés, tem permitido que você pare naquelas muradas metálicas da Beira-Rio para contemplar a outra margem deste caudaloso rio que nos cerca?

Eu imagino que não, e mesmo que parasse, você poderia me dizer que era um louco, um daqueles que acreditou naquele moleque risonho que, nestes computadores da vida, enfiou uma costa de oceano no nosso lado. O espírito da famigerada “Blumenhell” nos dias quentes.

Mas você está distante do significado destas ondas da Prainha. Você e os homens que a tornaram um porvir sem porvir, um futuro congelado em estruturas pichadas, gramado esquálido em verde-amarelado fazendo-se de tapete para uma calada quadra de areia, veredas mal frequentadas, uma velha barcaça dos rios em ferrugem, uma concha silenciada nos seus sons.

Ah, as ondas daquela Prainha. Você nunca as viu e, confesso, este escriba também não. Os antigos se dividem: aqueles que vociferam contra o hoje e os que choram o ontem, de vesperais a beira de um rio que, quando calmo, convidava a um audacioso banho.

A Prainha que tinha cara de praia, jeito de praia, areia de praia, barcos, bateiras, botes, jovens das ideias engomadas que faziam daquilo seu litoral. Nem mesmo o tempo, que lhe deu pompa e nome de presidente, lhe tirou este charme de balneário cenográfico na ponta mais aguda das curvas do Itajaí-Açu.

Ela lá, pimpona e faceira sendo o oposto dessa cidade corrida que teimava em crescer. O mundo real era ali do outro lado da barranca, na dita “cidade”, e deste lado corriam barcos, pescadores atrás dos robalos fugidos, remadores medalhados e partidas emocionantes de vôlei idílico da tarde.

Essa Prainha tão diferente da outra margem: daquele lado, os engravatados correndo com seus papeis e reuniões, e deste lado, o recanto de alguns que buscavam sua curiosa quietude, mirando as crianças no seu deleite enquanto sentiam aquela brisa ribeirinha do rio calmo em dias azuis.

Uma praia pitoresca, talvez um conto de fadas. Praia com Moinho? Praia de canção erudita e Rock pauleira? Praia de adultos rígidos ou de jovens frescos? Aquela curva esconde muito de muita gente: uma tarde de domingo, um recado de amor, uma letra melódica gritada em gargantas quase sem voz. Que tempos, queridos! Que tempos!


Como me falavam da Prainha na minha infância. A juventude energizada noventista ainda a ocupava em vesperais de paquera, talvez querendo que o domingo não acabasse antes do beijo naquela morena da escola, o motivador de você estar lá com seus compinchas procurando que ela te notasse na imensidão daquela curva.

Mas sabe, eu tenho que me acordar desse sonho acordado. Esses correres da cidade, essa vida moderninha meio que foi engolindo tudo aquilo. Sobrou só o luxo que oculta as areias da praia daquela ponta. Tudo tomou ar de abandono, cercado pelo teimoso cheiro de delinquência e entorpecente que se esconde em seus cantos ocultos. Cena mórbida, vazia, cheia de morte onde existia inocente vida.

E estes homens que apontam o dedo e nada conduzem? Aprontam mil apetrechos, falam em termos enrolados e gringos. Eles querem lhe fazer produto, consumo, luxúria. E nada entendem, entre seus papéis e riscos de projetos, deixam as areias cada vez mais sumirem em concretos alheios e mato seco, sem vida.

E eu, aqui do outro lado, tenho apenas como reflexo do que seria aquela Prainha as ondas do passado. Estas ondas: da música, do esporte, da infância em deslumbre bem na beirada do rio, até daqueles que se atreviam a banhar-se, a pescar em tempo fértil, a viver fechado naquela mundinho isolado do Centro hostil.

Ninguém mais vê as ondas da Prainha. E será que as verá um dia?

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