Som n’A BOINA #49: Don’t Think Twice, It’s Alright (Peter, Paul and Mary)

A poesia veio de Bob Dylan, o que não seria óbvio ante a beleza dos versos que o velho compositor colocou em sequencia. Mas, com o perdão a ele, é preciso que uma letra deste tamanho e significado tenha uma base sonora única. E esses três conseguiram, de novo, me parar para fazer ir muito além do “ouvir”.

Terceira faixa do lado B do belíssimo “In The Wind”, a canção de 1962 foi revivida um ano depois neste LP do trio Peter, Paul and Mary, sem dúvida uma das mais belas junções de vozes da música mundial, e eu não falo por exagero, é o que o Folk, na sua concepção mais crua, permitia fazer em matéria de melodia e voz juntas.

Conheço esse trio há muito tempo, e digo que sempre que preciso de reflexão, silêncio e inspiração para poetizar, recorro ao expediente vocal de Peter Yarrow, Noel Paul Stookey e da saudosa Mary Travers. Os três começaram a cantar juntos em 1961 e logo caíram nas graças de quem queria desviar-se do Rock comercial e mergulhar na introspecção das letras do Folk.

O modus-operandi do trio no palco pode lhe parecer espartano a primeira vista, mas é o suficiente para encantar e te fazer ficar em puro silêncio na combinação violão e voz: Dois (ou três) microfones, os violões de Peter e Paul e a combinação vocal dos dois com Mary, ela uma das mais belas cantores dos anos 1960 ao lado de Michele Phillips, do The Mamas and The Papas (admito!).

É uma fórmula arrebatadora, e essa fórmula do trio deu vida a letras de gente do naipe de Pete Seeger, Gordon Lightfoot e, claro, Bob Dylan. E de tantos que cantavam o que Dylan compunha, sem dúvida que Peter, Paul and Mary colocavam as letras em uma perspectiva que talvez nem ele conseguia: sensibilidade, introspecção, um leve cheio de campo até mesmo nas melodias mais agitadas.

O exemplo de “Don’t Think Twice, It’s Alright” é só um de tantos do trio. Da energia de Paul, da calma vocal de Peter e desta mistura que Mary colocava ao inserir seu vocal e balançar-se toda acompanhando o ritmo, sentindo a melodia. Nesta, em especial, a combinação poesia+musica é perfeita: uma letra simples, de nuances poéticas e mensagem direta combinadas com o crescendo suave dos vocais, e sem invencionices: só o violão e nada mais.

E se a musica, quando quer tocar fundo, precisa ter poesia, é nisso que me refiro. Tanto que faço questão de compartilhar, inteira, a letra desta faixa traduzida no bom português.

Dylan acerta, os três vão além. Gratidão por tanto!

Bem, não adianta sentar e se perguntar porquê, querida
Se você não sabe até agora
E não adianta sentar e se perguntar porque, querida
De algum modo não vais concluir nunca
Quando o seu galo cantar ao nascer do dia
Olhe pela sua janela e eu terei ido
Você é a razão por eu estar indo embora
Mas não pense duas vezes, está tudo certo

E não adianta ligar sua luz, querida
A luz que eu nunca conheci
E não adianta ligar sua luz, querida
Estou do lado escuro da estrada
Mas eu gostaria que houvesse algo
Que você pudesse fazer ou dizer
Que pudesse me fazer mudar de ideia e ficar
Mas de qualquer modo nunca fomos de muita conversa
Portanto, não pense duas vezes, está tudo certo

Não adianta chamar meu nome, garota
Como você nunca fez antes
Não adiante chamar meu nome, garota
Não consigo mais te ouvir
Estou pensando e imaginando, andando pela estrada
Eu amava uma mulher, digo, uma criança
Eu lhe dei o meu coração mas ela queria minha alma
Mas não pense duas vezes, está tudo certo

Adeus meu doce mel
Aonde vou, não sei dizer
E “adeus” é uma palavra boa demais, querida
Portanto direi apenas, “passar bem”
Não estou dizendo que você me tratou mal
Você poderia ter feito melhor, mas eu não me importo
Você apenas me fez perder o meu tempo precioso
Mas não pense duas vezes, está tudo certo

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