De volta aos textos embalados por som e história? SIM!
Finalmente, depois de tantos adiamentos, eis que o SnaB está voltando com a sequencia de crônicas e histórias do mundo da musica em todas as suas impressões. E sem perder tempo, vamos voltar a um assunto relativamente clássico mas que, para seus fãs, sempre dá muito caldo resgatar. Afinal, graças a esta passagem o mundo passou a conhecer bem melhor quem eram os quatro cabeludos suecos que revolucionaram o pop nos anos 1970. E isso já vai pra 45 anos tranquilos.
Em maio, a Europa assistiu mais uma festa da canção direto de Tel Aviv, na edição de 2019 do Eurovisão, um dos mais importantes e antigos festivais da musica do mundo. A vitória foi da Holanda que receberá a festa da musica em 2020 depois de exatos 40 anos, quando sediou o festival de 1980 “de improviso” por conta da recusa de Israel de realizar o evento que, à época, casava datas com o Yom Kippur, período sagrado do judaísmo.
Mas o assunto deste SnaB não é o hoje, e sim o ontem. Exatamente 45 anos atrás, em uma noite de relativo calor e em uma cidade da Inglaterra, onde acontecia mais uma vez a reunião da Europa em todo do que seria eleita a maior canção do continente no ano de 1974. O clima de festa e canção tomava conta de Brighton, um município litorâneo da costa sul britânica que recebia no famoso teatro no centro da cidade alguns dos mais talentosos conjuntos, cantores e cantoras europeus daqueles tempos.
Entre os concorrentes, um quarteto formado por dois casais de namorados que começavam a despontar no cenário musical pop da Europa no início dos anos 70. O grupo vinha da pequena-grande Suécia, um país nórdico conhecido pela sua fantástica organização política, social e econômica. Contando também com um relativo destaque em esportes conhecidos como o futebol e o automobilismo da época.
Neste clima colorido dos anos 70, entre revoluções musicais, contestação e novas idéias, o ABBA entrava no palco num dia 6 de abril para se apresentar no famoso festival, e assim arrebatar ao grande público e ao exigente corpo de jurados. Começava da melhor forma – com uma vitória e a aclamação de todo um continente – a carreira do maior grupo Pop de todos os tempos, história que veremos em uma breve viagem no tempo, entre melodias, cores e a história irreverente de uma guerra e de um imperador francês.
O despertar de uma lenda Pop
O ABBA como conhecemos bem, formado pelos casais Benny Anderson e Anni-Frid “Frida” Lyngstag e por Bjorn Ulvaeus e Agnetha Fältskog começou a trilhar o caminho da música juntos dois anos antes, em 1972.
Agnetha e Frida tinham antes do grupo um certo destaque no cenário musical do continente cantando em carreiras solo, já Benny e Bjorn tinham destaque em bandas conhecidas no cenário musical sueco, mas anônimas dentro da Europa. No intermédio desta roda estava o competente empresário Stig Anderson, fundador da Polar Music, em 1963, e que conduziria a máquina nórdica de Pop-Rock a um novo patamar.
Depois de encontros e desencontros, o grupo começou a encontrar o rumo certo do sucesso. Benny e Bjorn incorporaram em si o mesmo espírito de John Lennon e Paul McCartney e passaram a compor a maioria das canções do futuro quarteto. As primeiras apresentações agradavam ao público é era chegada a hora de vôos mais altos, para fora dos muros da Suécia, em busca da afirmação do que seria o ABBA anos mais tarde.
O Eurovisão de 1974
Pra quem ainda não conhece a peça, o Festival Eurovisão da Canção em pouco se assemelha com os tradicionais festivais musicais brasileiros dos anos 60 e 70. Era uma grande mistura dos mais variados ritmos de grande parte dos países da Europa. De canções tradicionais na língua-mãe como musicas Pop e Rock cantadas em puro inglês. Começou a ser disputado em 1956, com apenas sete dos tantos países integrantes do bloco europeu.
Em tempos de disputas, desavenças e renovação após a Segunda Guerra, um festival que congregasse os países europeus em torno da canção poderia ser considerado um tremendo desafio, e assim o era durante os anos, com várias entradas e saídas de nações e diversas polêmicas acerca de várias canções levadas ao concurso, e muitas delas vencedoras.
Em 1974, a sede escolhida “de improviso” seria a cidade litorânea de Brighton, ao sul da Inglaterra, que sucedia a Luxemburgo por conta de sua recusa a promover o festival dois anos seguidos. Para a edição daquele ano um país apenas estrearia entre os concorrentes – a Grécia – e a França ficaria ausente daquele ano, por conta da morte de seu presidente, Georges Pompidou, na semana do concurso.
Seriam 17 concorrentes, alguns deles conhecidos do público, com a jovem veterana Gigliola Cinquentti. A italiana trazia para o festival a canção “Sí”, que causaria um verdadeiro rebuliço no seu país. No mesmo dia do festival era realizado um plebiscito que decidiria sobre a revogação parcial – ou não – da lei do divórcio na Itália. O país, cuja influencia católica é marcante em suas leis, resolveu, pelo sim pelo não, evitar a exibição do Festival naquele dia acreditando que a letra de Gigliola “influenciaria no resultado do plebicito”. É mole?
Outra concorrente de destaque era a canção do português Paulo de Carvalho. Apesar de não ficar nem próxima do chamado “Top Five” do festival, “E Depois do Adeus” seria 19 dias mais tarde peça-chave na Revolução dos Cravos em Portugal, como uma das senhas que determinavam o início da ação das forças armadas para tomar o governo do país.
Mas a noite era sueca. Tudo parecia conspirar para o sucesso dos jovens e atrevidos suecos que foram apresentados com um certo humor pela BBC, responsável pela organização e geração de imagens. Os jurados e o público se surpreenderam logo na entrada do maestro responsável pela condução da orquestra para a música do grupo. Sven-Olof Walldoff aparecia caracterizado de Napoleão, integrando o clima histórico que traria “Waterloo”, a canção que seria executada pelo grupo, um de seus primeiros hits internacionais.
Recapitulando a história, a Batalha de Waterloo foi a maior derrota do então todo-poderoso exercito francês, sob o comando de Napoleão Bonaparte, em 1815. A derrota para os exércitos inglês, holandês e prussiano decretou o fim da chamada “Guerra dos Cem Dias” e pôs um ponto final no império napoleônico.
E foi montado no seu ainda insipiente estilo Glam Rock que o ABBA, em roupas reluzentes cravejadas de lantejoulas e detalhes brilhantes, fazia assim sua apresentação. Apesar de uma leve mostra tímida de Frida e Agnetha no vocal ambas mostravam sua perfeita sincronia vocal na apresentação da música. Uma verdadeira guerra em prosa e verso que surpreendentemente arrebatou o público, e colocou a Suécia no mapa da musica internacional.
Emplacando em paradas de todos os cantos do mundo, da América a Ásia, Africa e a própria Europa, o amadurecimento do grupo depois do festival foi constante e ainda atualmente os suecos são considerados franco-favoritos em várias edições do Eurovisão, tendo já conquistado incríveis cinco títulos.
Louros conquistados, a festa não poderia ser diferente após a conquista. Uma nova banda acabava de nascer no cenário musical internacional. O nascimento do ABBA em papel passado acabava de ter, sob as melhores condições, sua data de nascimento definida: 6 de abril de 1974, em Brighton, Inglaterra, em um Eurovisão onde tudo deu certo, e a lenda ganhou vida.
E a história de sucesso e revolução é conhecida até hoje e inesquecível para as futuras gerações. Ouça “Dancing Queen” e você entenderá o que foi o impacto daquela noite em uma cidade litorânea da Britânia.